Gostaria, antes de tudo, de exprimir a minha alegria por estar aqui hoje, neste Centro de Caux, rico de iniciativas que tem por objetivo reforçar os fundamentos morais e espirituais da sociedade e promover o encontro pacífico das culturas, das civilizações e das religiões. Agradeço, de maneira especial, ao Dr. Cornelio Sommaruga, que me convidou para dar a minha contribuição a este importante seminário inter-religioso.

O assunto que me foi pedido para abordar hoje, se intitula: “As religiões podem interagir no caminho para a paz?”.
Esta pergunta é, como todos nós sabemos, de grande importância e de extrema atualidade.

Na expansão do terrorismo, nas guerras conduzidas em várias partes do mundo, e na permanente tensão no Oriente Médio, muitos vêem os sintomas de um possível “conflito entre civilizações”. Isto seria assinalado e até mesmo aguçado pelas diferentes atribuições religiosas. Esta maneira de ver, porém, provocada por extremismos e fanatismos de vários tipos, que distorcem as religiões, resulta muito parcial numa leitura mais atenta dos fatos.

Com efeito, nunca como neste momento do mundo, fiéis e responsáveis de todas as religiões sentiram o dever de trabalhar juntos pelo bem comum da humanidade. Organizações como a Conferência Mundial das Religiões pela Paz ou iniciativas como a Jornada de Oração pela Paz, promovida por João Paulo II em Assis, em janeiro de 2002, são um testemunho disso.
Naquela ocasião, o Papa afirmou, em nome de todas as pessoas presentes, que “quem usa a religião para fomentar a violência, contradiz a inspiração mais autêntica e profunda” e que “não existe finalidade religiosa que possa justificar a prática da violência do homem contra o homem” porque “a ofensa ao homem é, definitivamente, ofensa a Deus”.

Com os acontecimentos de 11 de setembro de 2001, a humanidade, aterrorizada, descobriu a natureza deste grande e enorme perigo que é o terrorismo. Não é uma guerra como as outras – hoje em dia temos cerca de 40 em todo o planeta -, que são, geralmente, fruto do ódio, do descontentamento, das rivalidades, de interesses pessoais ou coletivos.
O terrorismo, pelo contrário, como afirmou ainda o Papa, é fruto também de forças do Mal, com “M” maiúsculo, das trevas.
Forças desse tipo não podem ser combatidas apenas com meios humanos, diplomáticos, políticos e militares. São necessárias forças do Bem, com “B” maiúsculo. E o Bem com “B” maiúsculo, nós sabemos, é Deus, e tudo aquilo que tem raízes n’Ele. Pode-se combater, portanto, com forças espirituais, com a oração, por exemplo, com o jejum, como fizeram os representantes das religiões do mundo, na cidade de São Francisco.

Mas, nos parece um dever dizer que a oração não é suficiente.
Nós sabemos que são muitas as causas do terrorismo, mas uma, a mais profunda, é o sofrimento insuportável diante de um mundo em parte pobre e em parte rico, que gerou e gera ressentimentos ocultos nas almas há muito tempo, violências, vinganças.
Existe a exigência de mais paridade, mais solidariedade, sobretudo de uma maior igualdade na partilha dos bens. Mas, como sabemos, os bens não se movem sozinhos, não caminham por si só. Devem ser movidos os corações, os corações devem ser colocados em comunhão!
E para isso é necessário difundir o máximo possível entre as pessoas a idéia e a prática da fraternidade e, considerando a amplitude do problema, de uma fraternidade universal. Os irmãos sabem pensar nos irmãos, sabem como ajudá-los, sabem partilhar o que possuem.

Para responder a este desafio sem precedentes, a contribuição das religiões é decisiva. De onde, senão das grandes religiões tradicionais, poderia partir uma estratégia de fraternidade, capaz de dar uma virada até mesmo nas relações internacionais?
As enormes fontes espirituais e morais, a contribuição de idealismo, de aspirações à justiça, de empenho em favor dos mais necessitados, juntamente com todo o peso político de milhões de fiéis, que brotam do sentimento religioso, canalizados no campo das relações humanas, poderiam, sem dúvida, ser traduzidos em ações que influenciem positivamente a ordem internacional.
Estão sendo realizadas muitas coisas no campo da solidariedade internacional, por parte das organizações não-governamentais. O que está faltando é que os governos assumam escolhas políticas e econômicas adequadas à construção de uma comunidade fraterna de povos empenhados em realizar a justiça.
Porque, diante de uma estratégia de morte e de ódio, a única resposta válida é construir a paz na justiça. Mas sem a fraternidade não existe paz. Somente a fraternidade entre os indivíduos e povos poderá assegurar um futuro de convivência pacífica.
Além do mais, a fraternidade universal e a conseqüente paz não são idéias de hoje. Essas idéias estiveram presentes, muitas vezes, nas mentes de espíritos fortes, porque “o plano de Deus sobre a humanidade é a fraternidade e o amor fraterno está inscrito no coração de todo ser humano”. “A regra de ouro – dizia o Mahatma Gandhi – é sermos amigos do mundo e considerar “uma só toda a família humana.
E Martin Luther King: “O meu sonho é que um dia os homens (…) irão perceber que foram criados para viverem juntos como irmãos (…); (e) que a fraternidade (…) vai ser tornar a ordem do dia para um homem de negócios e a palavra de ordem do homem que governa”.
Nesta mesma linha, o Dalai Lama, escreveu aos seus seguidores, a respeito do que aconteceu nos Estados Unidos, dois anos atrás: “Para nós, as razões (deste acontecimento) são claras. (…) Não nos lembramos das verdades humanas mais básicas. (…) Somos todos um. Esta é uma mensagem que a raça humana ignorou demais. Esquecer-se dessa verdade é a única causa do ódio e da guerra”.
Apesar da destruição, poderá emergir das ruínas do terrorismo, uma grande e antiga verdade: que todos nós, na terra, somos uma única e grande família.

Mas quem indicou e trouxe esta verdade como dom essencial à humanidade foi Jesus, que assim rezou antes de morrer: “Pai, que todos sejam um” (Jo 17,21). Ele, revelando que Deus é Pai e que, por isso, os homens são todos irmãos, introduziu a idéia da fraternidade universal. E com isso derrubou os muros que separavam os “iguais” dos “diferentes”, os amigos dos inimigos.
Sem dúvida, cada um de nós, movido pela própria fé religiosa, deve ter feito experiências positivas que podem ser úteis para a solução dos problemas semelhantes aos atuais.
E já que este é o momento no qual – como dizia um bispo especialista neste campo – “as religiões devem extrair do profundo de si mesmas, as suas forças espirituais para ajudar a humanidade e conduzi-la à solidariedade e à paz”, permitam-me oferecer aos senhores a minha experiência em contato com pessoas de todas as idades, línguas, raças e, sobretudo, de religiões diferentes, em todos os pontos da terra. É uma experiência de diálogo que poderá fornecer uma chave para uma convivência fraterna e pacífica, experiência que, ao meu ver, está em consonância com o espírito das sessões de Caux, que privilegiam os testemunhos pessoais mais do que as exposições teóricas.

A arte de amar
A 60 anos do início da experiência do Movimento dos Focolares, se renova sempre a surpresa em ver como o caminho espiritual por que Deus nos conduziu, se cruza com todos os outros caminhos espirituais dos cristãos, mas também de fiéis de outras religiões. Na prática, é a experiência de nos tornarmos parceiros no caminho da fraternidade e da paz. Mesmo mantendo a nossa identidade, permite que nos encontremos e nos compreendamos com as grandes tradições religiosas da humanidade.
Em outras palavras, na obediência e na escuta do Espírito Santo, nos foi ensinado como colocar em prática, com sucesso, aquela palavra que está inscrita no DNA de todo homem e de toda mulher, porque criados à imagem de Deus-Amor, Deus Pai: amar, amar o próximo, amar os irmãos. Aquela palavra, somente ela, que pode fazer da humanidade uma família.
Amor, não como geralmente se pensa, mas aquele comportamento que possui exigências imprescindíveis.
Aquele amor que, se para os cristãos é até mesmo uma participação do amor que está em Deus, não falta nos Livros Sagrados das outras religiões.
O primeiro passo para nós, a primeira iluminação sobre este novo estilo de vida, foi durante a Segunda Guerra Mundial. Diante das ruínas dos ideais e da perda de todos os nossos bens materiais, sentíamos a necessidade de nos fixarmos a alguma coisa que não passasse e que nenhuma bomba pudesse destruir: Deus. Nós o escolhemos como o único ideal da nossa vida acreditando, apesar de tudo, no Seu amor de Pai, amor por todos os homens da terra.
Mas é óbvio que não era suficiente acreditar no amor de Deus; não bastava termos feito a grande escolha dele como o Ideal da nossa vida. A presença e a solicitude de um pai chamava cada um de nós a sermos filhos, a amarmos e a atuarmos, dia após dia, aquele desígnio de amor que o Pai tem para cada um de nós, isto é, a fazermos a Sua vontade.
E sabemos que o primeiro desejo de um pai é que os filhos se tratem como irmãos, se queiram bem, se amem.
E quer que amemos como Ele faz, sem distinções. Não podemos escolher entre o simpático ou o antipático, o bonito ou o feio, o branco, o negro ou amarelo; o europeu ou o americano, o cristão ou o judeu, o muçulmano ou o hindu… O amor não conhece “nenhuma forma de discriminação”.
Esta mesma fé no amor de Deus pelas suas criaturas nós encontramos também em muitos outros irmãos e irmãs de outras religiões, começando pelas religiões abrâmicas, que afirmam a unidade do gênero humano, o cuidado que Deus tem com toda a humanidade e o dever de cada criatura humana de agir como o Criador, com imensa misericórdia em relação a todos.
Um ditado muçulmano diz: “Deus perdoa cem vezes, mas reserva a Sua suprema misericórdia àqueles cuja piedade terá poupado a menor de Suas criaturas”.
E o que dizer da infinita compaixão por todo ser vivente ensinada por Buda, que dizia aos seus primeiros discípulos: “Ó monges, deveis operar pelo bem-estar de muitos, pela felicidade de muitos, movidos de compaixão pelo mundo, pelo bem-estar (…) dos homens”.
Para um cristão, todos devem ser amados, porque em cada um se ama Cristo. Ele mesmo nos dirá um dia: “A mim o fizeste” (Mt 25,40).

Amar a todos, portanto, sem distinção.

Mas existe uma outra característica desse amor que é muito conhecida, citada em todos os Livros Sagrados e que sozinha, se vivida, seria suficiente para fazer do mundo uma grande família: amar como a nós mesmos, fazer aos outros aquilo que gostaria fosse feito a você, não fazer aos outros aquilo que não gostaria que fosse feito a você. É a assim chamada “regra de ouro”, à qual foi feita menção também na apresentação desse seminário. Ela foi muito bem expressa por Gandhi quando afirmou: “Você e eu somos uma coisa só: não posso lhe fazer mal sem me ferir”. Na tradição muçulmana é conhecida dessa forma: “Nenhum de vocês é um verdadeiro fiel senão deseja para o seu irmão o que deseja para si mesmo”.
O Evangelho a anuncia desse modo: “Tudo aquilo que quereis que os outros vos façam, fazei-o vós a eles” (Mt 7,12). E Jesus comenta: “esta, de fato, é a Lei e os Profetas”.
Nesta simples norma, semeada pelo Espírito Santo em todas as religiões, está, portanto, o concentrado de todos os mandamentos de Deus. Convém contar muito com ela no diálogo inter-religioso.
Desta regra que, com razão, é chamada “de ouro”, emana uma norma que, por si mesma, se aplicada, seria o maior impulso para a harmonia entre indivíduos e grupos.
Um outro modo que nos ensina como colocar em prática o amor pelos outros é expresso por uma simples fórmula, composta por duas palavras: “fazer-se um”.
“Fazer-se um” com os outros significa assumir o peso deles, os seus pensamentos, seus sofrimentos e suas alegrias.
O “fazer-se um” é válido, sobretudo, no diálogo inter-religioso. Está escrito: “Conhecer a religião do outro implica estar na pele do outro, ver o mundo como o outro o vê, penetrar no sentido que tem para o outro ser um budista, muçulmano, hindu, etc.”.
Este “viver o outro” abraça todos os aspectos da vida e é a máxima expressão do amor, porque vivendo dessa forma estamos mortos a nós mesmos, ao nosso próprio eu e a todo apego; podemos realizar aquele “aniquilamento de si mesmos” a que aspiram as grandes espiritualidades e aquele vazio de amor que se realiza no ato de acolher o outro. “Fazer-se um” significa estarmos diante de todos numa atitude de aprendizado e, realmente, sempre existe algo para se aprender.

Uma outra exigência desse amor é, talvez, a que exige maior esforço. Coloca à prova a autenticidade do amor, a sua pureza e, portanto, a sua verdadeira capacidade de gerar a unidade entre os homens e a fraternidade universal. Trata-se de amar por primeiro, isto é, de não esperarmos que o outro dê o primeiro passo; de sermos os primeiros a agir, a tomarmos a iniciativa.
Esta maneira de amar nos expõe mas, se queremos amar à imagem de Deus e desenvolver esta capacidade de amor que Deus colocou no nosso coração, devemos fazer como Ele, que não esperou ser amado por nós, mas nos demonstrou desde sempre e de muitas maneiras, que Ele nos amou por primeiro, independentemente da nossa resposta.
Nós fomos criados como um dom uns para os outros e realizamos esse nosso ser doando-nos aos nossos irmãos e irmãs com aquele amor que precede qualquer gesto de amor do outro. Os grandes fundadores das religiões, com a sua vida, nos ensinaram isso.
Jesus nos deu o exemplo; Ele disse: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos outros” (Jo 15,13), e Ele a deu realmente. Deu a vida por nós pecadores, que certamente não éramos amáveis.

Quando este esforço de amar primeiro é vivido por duas ou mais pessoas, o amor é recíproco, e é o princípio e o fundamento seguro da paz e da unidade do mundo. A nossa experiência nos diz que, para aqueles que lutam hoje para mover as montanhas do ódio e da violência, a tarefa é imensa. Mas o que é impossível para milhões de homens isolados e divididos, se torna possível para as pessoas que fizeram do amor recíproco, da compreensão recíproca, da unidade, a razão essencial da própria vida.
E tudo isso tem um porquê, uma chave secreta e um nome. Quando entramos em diálogo entre nós, das mais variadas religiões, quando nos abrimos uns aos outros no diálogo feito de benevolência humana, de estima recíproca, de respeito, de misericórdia, nos abrimos também para Deus e “fazemos com que – são palavras de João Paulo II – Deus esteja presente no nosso meio”.
Eis o grande fruto do nosso amor recíproco e a força secreta que dá vigor e sucesso aos nossos esforços para levarmos por toda a parte a unidade e a fraternidade universal. É o que o Evangelho anuncia aos cristãos quando diz que, se duas ou mais pessoas se unem no amor verdadeiro, o próprio Cristo estará presente entre eles e, portanto, em cada um deles.
E que garantia melhor podemos ter do que a presença de um Deus, que possibilidade superior poderia existir para aqueles que querem ser instrumentos de fraternidade e de paz?

Este amor recíproco, esta unidade que dá tanta alegria a quem a coloca em prática requer, entretanto, um empenho, um treinamento cotidiano, pede sacrifício.
E aqui aparece, com toda a sua luminosidade e dramaticidade, na linguagem cristã, uma palavra que o mundo não quer nem mesmo ouvir pronunciar, porque é considerada insensatez, absurdo, sem sentido.
Esta palavra é: cruz.
Não se realiza nada de bom, de útil, de fecundo no mundo, sem conhecer, sem saber aceitar o cansaço, o sofrimento, em uma palavra, sem a cruz.
Não é uma brincadeira nos empenharmos em viver sempre o amor recíproco, em levar a paz e a suscitar a fraternidade! É preciso coragem, é preciso saber sofrer.
O que lhes expliquei não é uma utopia. É uma realidade vivida há mais de meio século por milhões de pessoas, experiências-piloto daquela fraternidade universal e daquela unidade que todos nós desejamos.
Com este modo de amar foram abertos diálogos fecundos no nosso Movimento: entre cristãos de muitas Igrejas, entre fiéis de diferentes religiões e entre pessoas das mais variadas culturas. Juntos nos encaminhamos para aquela plenitude da verdade que todos almejamos.
A experiência de diálogo inter-religioso do Movimento dos Focolares
Agora vou me deter, particularmente, nas oportunidades de encontro que tivemos, desde o início, com irmãos e irmãs de outras confissões religiosas.
A primeira experiência forte que fizemos foi em contato com o povo Bangwa, uma tribo da República dos Camarões, enraizada na religião tradicional, quase exterminada pela mortalidade infantil, que estávamos começando a assistir.
Um dia, o líder deles, o rei, e milhares de membros do seu povo, se reuniram para uma festa, num grande encontro no meio da floresta, para nos apresentar seus cantos e danças. Então, foi ali que tive uma forte impressão de que Deus, como um imenso sol, abraçasse a todos, nós e eles, com o seu amor. Pela primeira vez na minha vida, intuí que teríamos alguma ligação com pessoas de tradições não cristãs.

Mas o evento que de certa forma assinalou a “fundação” desse nosso diálogo aconteceu em Londres, em 1977, numa cerimônia para a entrega do Prêmio Templeton para o Progresso da Religião. Proferi um discurso e quando estava saindo da sala, os primeiros que vieram me cumprimentar foram judeus, muçulmanos, budistas, siks, hindus… O espírito cristão do qual lhes havia falado os impressionou muito; dessa forma, ficou claro para mim que deveríamos nos dedicar não somente à nossa e às outras Igrejas cristãs, mas também a estes irmãos e irmãs de outras confissões religiosas. Iniciou-se assim, o nosso diálogo inter-religioso.
Dois anos depois, de fato, aconteceu o encontro com uma grande personalidade budista, o Reverendo Nikkyo Niwano, fundador da Rissho Kosei-kai, que me convidou a falar em Tóquio, a 10 mil budistas, sobre a minha experiência espiritual. Desde então, entre os focolarinos e os membros da Rissho Kosei-kai, nasceu uma grande fraternidade, em todas as partes do mundo.

Mas os encontros mais surpreendentes com o budismo, realizaram-se com os grandes representantes da experiência monástica tailandesa.
Durante uma longa permanência deles na nossa cidadezinha internacional de Loppiano, na Itália, onde os seus 800 habitantes procuravam viver com fidelidade o Evangelho, dois deles ficaram profundamente tocados pela unidade entre todos e pelo amor cristão, que não conheciam.
Dessa forma, diminuíram os julgamentos que impediam um verdadeiro diálogo entre eles, budistas, e nós, cristãos.
Estes monges, voltando para a Tailândia, não perderam a oportunidade de contar, para milhares de fiéis e centenas de monges, a experiência deles sobre o contato com o Movimento dos Focolares. Nasceu assim, se é que podemos dizer, um Movimento budista-focolarino, isto é, budista-cristão, que é uma das porções de fraternidade que estamos edificando no mundo.
Em seguida, fui convidada a ir até a Tailândia, a uma Universidade budista e a um templo, para falar a monjas, monges e a muitos leigos e leigas.
Também lá o interesse foi notável, enquanto que nós ficamos edificados com o desapego de tudo – que os caracteriza – e com a ascética deles.

E o diálogo com o Islã?
Atualmente são 6.500 os amigos muçulmanos que pertencem ao nosso Movimento, e o que nos une a eles é sempre a nossa espiritualidade, na qual encontram incentivos e confirmações para uma mais profunda e vital adesão ao núcleo central da espiritualidade islâmica. Tivemos vários encontros com os amigos muçulmanos. O que caracterizou estes congressos foi, antes de mais nada, a presença de Deus que se percebe especialmente quando eles rezam e que nos dá muita esperança.
Esperança que vi se tornar realidade, pessoalmente, na Mesquita Malcolm Shabazz, do Harlem, nos Estados Unidos, seis anos atrás, diante de 3 mil muçulmanos afro-americanos, aos quais fui convidada a apresentar a minha experiência cristã.
A acolhida deles, começando pelo líder, o Imã W.D. Mohammed, foi tão calorosa, sincera e entusiasmante que abria o coração ao sonhos mais promissores para o futuro.
Voltei aos Estados Unidos, em Washington, há três anos, para apresentar a muitas pessoas a nossa colaboração, por ocasião de um congresso organizado por eles e que reuniu 7 mil pessoas, entre cristãos e muçulmanos. Numa exultação que não era meramente humana, num abraço sincero, com um aplauso interminável, prometemos prosseguir o nosso caminho na mais plena união possível, e de ampliá-lo a muitos outros: eis então, outras porções de fraternidade.

Não posso deixar de citar os encontros cada vez mais freqüentes com irmãs e irmãos judeus em Israel e em outros lugares. O último encontro se realizou em Buenos Aires, com uma de suas comunidades mais expressivas, acompanhado depois por outros membros do Movimento, em várias ocasiões.
Foi com grande emoção que selamos um pacto de amor recíproco, muito profundo e desejado, que nos deu a impressão de termos superado, de repente, séculos de perseguições e de incompreensões.

Nos últimos três anos teve início um diálogo promissor na Índia, com os hindus. Temos relacionamentos fraternos e intensos com movimentos gandhistas, no sul daquele imenso país. Em Mumbai, nasceu um profundo diálogo com professores da Universidade Somaiya e do Instituto Cultural Indiano. Mais recentemente, iniciamos um relacionamento com um Movimento muito vasto, o Swadhyaya, que tem os nossos mesmos objetivos, da unidade na diversidade e de fraternidade.
Há um ano, realizamos também o primeiro Simpósio hindu-cristão. Criou-se uma atmosfera tão bela e elevada que pudemos apresentar a eles muitas verdades da nossa fé. A impressão que tivemos é de que nos foi aberto um horizonte antes inimaginável.
Há poucos meses, voltei à Índia e pudemos continuar esse diálogo em nível de espiritualidade que – na opinião de autoridades da minha Igreja – “é o ápice das várias formas de diálogo e responde às mais profundas expectativas dos homens de boa vontade”. Estão previstos outros Simpósios semelhantes, budista-cristão e islâmico-cristão.

Graças à expansão universal do nosso Movimento, estamos em contato com todas as principais religiões do mundo e são cerca de 30 mil os membros dessas religiões que compartilham, sempre na medida do possível, a espiritualidade e os objetivos do Movimento.

Como dialogar?
O nosso diálogo inter-religioso teve uma evolução rápida e fecunda porque o elemento decisivo e característico foi a arte de amar, da qual lhes falei anteriormente.
No clima de amor recíproco que a atuação da regra de ouro suscita, pode-se, de fato, estabelecer o diálogo com os próprios interlocutores, diálogo no qual procuramos nos fazer “nada” para “penetrar”, de certa forma, no outro.
“Fazer-se nada” ou “fazer-se um” com os outros, é sinônimo.
Nessas duas simples palavras, às quais já me referi, está o segredo do diálogo que pode gerar a unidade.
“Fazer-se um”, de fato, não é uma tática ou uma maneira externa de agir; não é somente uma atitude de benevolência, de abertura e de respeito, ou a ausência de julgamentos. É tudo isso, mas com algo a mais.
Esta prática de “fazer-se um” exige que tiremos da nossa mente as idéias, do coração os afetos, da vontade cada coisa, para nos identificarmos com o outro. Não podemos entrar na alma de um irmão para compreendê-lo, para compartilhar as suas dores ou a sua alegria, se o nosso espírito está cheio de uma preocupação, de um julgamento, de um pensamento… de qualquer coisa. O “fazer-se um” exige espíritos pobres, pobres em espírito para sermos ricos de amor.
Esta atitude importantíssima e imprescindível tem um duplo efeito: nos ajuda a nos inculturarmos no mundo dos outros, conhecendo a sua cultura e a sua linguagem, predispondo os outros a nos escutarem.
Notamos, de fato, que quando alguém morre a si mesmo, justamente para se “fazer um” com os outros, eles ficam impressionados e pedem explicações.
Assim, podemos passar ao “anúncio respeitoso” através do qual, por lealdade diante de Deus e diante de nós mesmos, e também por sinceridade diante do próximo, dizemos o que a nossa fé afirma sobre o assunto do qual se fala sem, no entanto, impormos nada ao outro, sem sombras de proselitismo mas, por amor. É o momento no qual, para nós cristãos, o diálogo desemboca no anúncio do Evangelho.

O nosso trabalho com muitos irmãos e irmãs de grandes religiões e a fraternidade que experimentamos com eles nos convenceu de que o pluralismo religioso da humanidade pode perder sempre mais o seu potencial negativo enquanto causa de divisões e de guerras para conquistar, na consciência de milhões de homens e mulheres, o sabor de um desafio: o de recompor a unidade da família humana, porque em todas as religiões, de alguma forma, está presente e ativo o Espírito Santo, não somente nos membros individualmente, mas também dentro de cada tradição religiosa.

Falando do maravilhoso evento de Assis, João Paulo II o definiu como “manifestação extraordinária daquela unidade que nos une além das diferenças e das divisões”.

Preenchamos, portanto, o nosso coração do verdadeiro amor. Com ele, tudo podemos esperar quanto à unidade entre os fiéis das grandes religiões e à fraternidade vivida por toda humanidade.

Obrigada pela atenção.
Que Deus nos abrace a todos com o seu amor.

Chiara Lubich

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