facebook_1481010213236Pela primeira vez assisti a um concerto de música clássica no meio de uma batalha. Em Aleppo acontece que no meio da morte uma voz de paz se eleva entre todas as outras que anunciam a guerra, para confortar os ânimos e esquecer por alguns instantes a morte e o frio. É como um capítulo de uma tragédia moderna que lembra a mitologia grega. Com poucos meios, Padre Elias Janji com o coro Naregatsi e a pianista, apresentaram trechos de Verdi, Mozart, Vivaldi e Karl Orf, numa igreja lotada, apesar do frio polar que invade Aleppo nestes dias, elevando os nossos espíritos a um outro céu.

E pensar que não tão distante daqui a tragédia continua com mísseis lançados de Aleppo oriental sobre a parte ocidental, matando crianças nas escolas e pessoas inocentes, enquanto que na parte oriental da cidade continua o ataque do exército sírio. Milhares de pessoas (se fala de 60.000 até hoje) conseguiram fugir de Aleppo oriental e se refugiar na região ocidental. Contam como muitos foram presos como reféns e que em outros, enquanto escapavam, dispararam pelas costas matando alguns; outros, ainda, corriam no meio dos disparos carregando a avó ou outros parentes idosos nas costas.

As pessoas estão contentes porque finalmente alguns puderam voltar às suas casas libertadas nestes dias enquanto o exército tomou posse da estação de bombeamento da água de toda a cidade, mesmo se minada. Está previsto que em um mês, depois que os técnicos tiverem terminado o seu trabalho, a água voltará para toda a cidade. Assim terminará um capítulo da tragédia, mas com certeza, acho, haverá outros.

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No dia 4 de dezembro se recorda Santa Bárbara, a jovem adolescente mártir dos primeiros séculos do cristianismo ferida com a espada pelo pai porque, crendo em Jesus, não aceitara adorar outro Deus. Uma grande festa para os cristãos do Oriente, por isso, apesar da guerra, adultos e crianças se reuniram para festejá-la, fantasiados e cantando a sua história, uma história que – apesar dos séculos – mudou pouco. É de se perguntar o que restou do homem e da sua dignidade?

O que acontecerá agora? Terminará a guerra em Aleppo dando novamente tranquilidade às pessoas que sofreram tanto, ainda que se encontrará com uma grande parte da cidade destruída?

A população está cansada e quer que o conflito acabe, mas os grupos armados não se dão por vencidos e querem combater até o fim. Apesar do apelo do enviado especial da ONU, Staffan De Mistura, a todos os grupos a deixarem a cidade e a pouparem a vida das pessoas que, caso contrário, pagará com um número de vítimas muito alto, segundo a lógica da guerra!

Mas como esquecer que no final é o Homem que morre, uma vez que cada um, bom ou mau, é feito à imagem de Deus, mesmo se esta se acha sepultada debaixo de milhares de vícios e maldades.

Com o Natal que bate às portas, pedimos então que não seja somente recordar um fato passado com as comemorações habituais, mas que a chegada do “Príncipe da Paz” mude algo nos corações e nos gestos de todos nós, e que se tornem pequenas pedras na construção de um mundo melhor, que todos sonhamos.

De Aleppo, Pascal Bedros

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