Movimento dos Focolares
Peru – Autoridade e misericórdia

Peru – Autoridade e misericórdia

Conciliar profissão e paternidade segundo os valores do Evangelho: a experiência de um médico peruano na linha de frente na luta contra a COVID-19. Sou médico há 25 anos e pai desde os 17, mas percebi que ainda não aprendi a ser um nem outro em coerência com os valores nos quais acredito. Esses tempos de pandemia estão se mostrando uma verdadeira escola para mim, para crescer em ambos os papeis, inclusive em aspectos que até agora eram subestimados não só por mim, mas pela maioria das pessoas. Desde o início dessa pandemia mundial, trabalho em um hospital de campanha para pacientes com a Covid na cidade de Piura, no norte de Peru, o primeiro na cidade. Acompanho os doentes recuperados e vi mais pacientes morrerem nesses últimos três meses do que nos 25 anos como médico. Eu me formei em uma das melhores faculdades de medicina do país com prestígio acadêmico e rigor científico. Essa doença terrível me fez descobrir os limites, a impotência e a frustração da medicina diante desse vírus desconhecido. Apesar da administração de oxigênio e as terapias que a ciência nos coloca à disposição, vi meus pacientes sofrerem muito e morrerem de asfixia, e todos os dias nos deparamos com a falta de profissionais e equipamentos em um hospital como o nosso, em um país pobre. E me sinto impotente e frustrado muitas vezes diante dos pacientes quando a doença se torna agressiva! Em meio à desorientação geral, ouvia-se o grito: “Estou com sede! Água, por favor! Alguém me dê água! Água”; às vezes, as pessoas ficavam resmungando e, só quando nos aproximávamos delas e perguntávamos se queriam algo para beber é que balançavam a cabeça. Foi assim que, além do meu trabalho, comecei a dar algo de beber a todos que me pediam, a arrumar o travesseiro, a pegar nas mãos deles, a acariciar a cabeça, a massagear as costas quando me pediam, a passar o balde de urinar. Ou simplesmente os ajudava a caminhar, rezava com eles ou por eles e, no fim, procurava lhes confortar nos últimos momentos. Entendi que a medicina tem uma dimensão dupla: aquela da autoridade, apoiada na ciência que geralmente cura, mas também tem a dimensão do ser humano, baseada na misericórdia e no amor que vêm que Deus e se exprimem em atos cotidianos e simples que muitas vezes curam a alma. Ciência e humanidade plena, conhecimento e misericórdia, corpo e alma, homem e Deus, razão e fé: é uma moeda de dois lados que torna pleno o doar e o viver; um equilíbrio delicado de se atingir. Entre o trabalho extenuante no hospital, a sobrecarga de emoções intensas e minhas fraquezas, voltava para o jantar em casa com um só desejo: descansar e desabafar. Meu filho mais velho, no auge da adolescência, frustrado por causa do lockdown e com a energia da juventude, começou a discutir com todos, principalmente comigo. Tratava-me como um adversário ou inimigo e estar à mesa era como um campo de batalha. Inicialmente, dominado pelas minhas paixões e impulsos, nos encontramos em uma espécie de luta amarga com tons ofensivos. Pela enésima vez, vi minha autoridade comprometida e a tentativa de impô-la a força piorou as coisas. Em casa, também descobri outros aspectos da minha paternidade como a misericórdia e a humildade e assim comecei a me calar e a oferecer a Deus o meu perdão diante das ofensas, mas também a exprimir e pedir desculpas se eu percebia que tinha passado dos limites. Procurei ler no comportamento agressivo do meu filho um pedido de ajuda e de afeto; a calar-me mais para atenuar o tom das discussões e a continuar rezando sozinho e em família mesmo quando parecia ser inútil. Pouco a pouco, nosso relacionamento está voltando ao normal. Mais uma vez esses dois eixos essenciais: autoridade e misericórdia. Será que não são expressões da vida divina?

Por Gustavo E. Clariá

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Novos caminhos para uma ecologia integral

Novos caminhos para uma ecologia integral

“Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação”. O compromisso dos Focolares com a adesão à iniciativa “O Tempo da Criação” e com uma reunião em outubro de 2020. O dia 1º de setembro é o “Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação”. A data foi estabelecida pelo Papa Francisco em 2015, no ano da Encíclica Laudato si’. Nela o Papa convida a todos a se comprometerem com os cuidados da Criação. É a nossa casa, o nosso bem mais precioso. E ele pede que superemos o atual sistema sócio-econômico. Não podemos mais explorar o planeta Terra como se existissem recursos naturais ilimitados. Devemos agir rapidamente e encontrar um modelo diferente de desenvolvimento. O que podemos fazer para sermos mais concretos? A Laudato si’ mostra um caminho para uma “conversão ecológica”: mudar os estilos de vida e tentar colocar em prática os princípios da ecologia integral. Neste texto, portanto, o Pap não fala apenas do meio ambiente, mas também da política, da economia, da sociedade. É necessário partir de nós mesmos, de nossas escolhas diárias de consumo, das eleições, para escolher políticos mais atentos aos cuidados com a natureza; para ter mais influência na sociedade a fim de aumentar as energias renováveis e diminuir o uso de fontes fósseis. Também este ano o Movimento dos Focolares adere à iniciativa “O Tempo da Criação”, celebração anual de oração e ação pela nossa casa comum que começa em 1º de setembro e termina em 4 de outubro, festa de São Francisco de Assis, o santo padroeiro da ecologia, amado por muitas denominações cristãs. Esta rede global incentiva a todos a organizar eventos e registrá-los no site. Uma iniciativa ecumênica com raízes de trinta anos: em 1989, foi o Patriarca da Igreja Ortodoxa de Constantinopla, Dimitrios, que deu o impulso decisivo às diversas Igrejas cristãs para declararem conjuntamente o 1º de setembro “Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação”. O tema sugerido para este ano é “Jubileu pela Terra: novos ritmos, nova esperança”. Um evento útil para considerar a relação integral entre o repouso da Terra e as formas de vida ecológica, econômica, social e política, especialmente como resultado dos efeitos de longo alcance causados pela pandemia global da Covid-19. De 23 a 25 de outubro, em Castel Gandolfo (Itália), haverá também um encontro organizado pela EcoOne – rede ecológica do Movimento dos Focolares – que contará com a presença de especialistas, políticos, professores universitários, organizações e associações, para examinar o impacto da Laudato si’ no mundo contemporâneo e os novos caminhos explorados para uma ecologia integral.  O evento tem como objetivo destacar o papel que indivíduos e entidades sociais podem desempenhar no cuidado da nossa casa comum. Este também é um ano especial, porque no dia 24 de maio passado, por ocasião do quinto aniversário da Encíclica, o Papa Francisco anunciou um ano extraordinário – até 24 de maio de 2021 – da “Laudato si’”. A urgência da situação é tal que requer respostas concretas e imediatas envolvendo todos os níveis, tanto local como regional, nacional e internacional. Em particular, é necessário criar “um movimento popular”, a partir da base, e uma aliança entre todos os homens de boa vontade. Por este motivo, é importante participar de iniciativas como “A Hora da Criação” ou da reunião EcoOne, em outubro próximo. Como nos lembra o Papa Francisco, “todos nós podemos colaborar como instrumentos de Deus para o cuidado da criação, cada um com sua própria cultura e experiência, suas próprias iniciativas e habilidades. (LS, 14)

Lorenzo Russo

Um amor a serviço dos outros

Em muitos países, as restrições devido à pandemia do coronavírus também bloquearam todas as formas de encontros religiosos, de cultos, de orações. No entanto, o desejo dos fiéis de estarem com Deus não diminuiu. O que fazer? Chiara Lubich propõe um caminho original. “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos”(Mt 28,20). […] Jesus dirige essas palavras aos discípulos  […] (mas) pensava também em todos nós, que haveríamos de viver a vida complexa do dia a dia. Sendo Ele o Amor feito homem, deve ter pensado: “Eu gostaria de estar sempre com os homens; gostaria de partilhar com eles todas as suas preocupações, gostaria de os aconselhar, gostaria de caminhar com eles pelas ruas, entrar nas casas, reavivar a alegria deles com a minha presença”. Foi por isso que Ele decidiu permanecer conosco e fazer-nos sentir a sua proximidade, a sua força, o seu amor. […] Se vivermos tudo o que Ele mandou, e de modo especial o seu mandamento novo, poderemos experimentar esta sua presença inclusive fora das igrejas, em meio às pessoas, lá onde vive o povo, em todo lugar. A parte que cabe a nós é manter o amor mútuo, de serviço, de compreensão, de participação nas dores, nos anseios e nas alegrias dos nossos irmãos; aquele amor que é típico do cristianismo, que tudo cobre, que tudo perdoa. Procuraremos viver assim, para que todos tenham já nesta terra a possibilidade de se encontrar com Jesus.

Chiara Lubich

  Tirado de: Parola di Vita, Maggio 2002, in: Chiara Lubich, Parole di Vita, pag. 657. Città Nuova Ed., 2017.

A “experiência” da Mariápolis Lia se torna curso universitário

A “experiência” da Mariápolis Lia se torna curso universitário

A escola da Mariápolis permanente argentina, que há cinquenta anos vem formando milhares de jovens do mundo inteiro, apresenta-se agora como “programa de extensão universitária e de formação profissional”. Até pouco mais de um mês poderia ser definido como uma espécie de mestrado em “vida no estilo da cultura da unidade”, mas agora a “experiência”, como sempre foi definido o curso anual para jovens da Mariápolis Lia, na Argentina, possui uma certificação universitária. O novo programa de estudos é resultado da elaboração conjunta entre as equipes pedagógicas da Fundação Centro Latino-americano para a Evangelização Social (CLAdeES) e a Escola Juvenil Mariápolis Lia, em acordo com a Universidade Nacional do Nordeste da Província de Buenos Aires (Unnoba). O “programa de extensão universitária e de formação profissional” – este é o título acadêmico que os estudantes obterão em O’Higgins – combina a dimensão de formação integral segundo quatro eixos temáticos: antropológico-filosófico, histórico-cultural, comunitário e transcendente. Tem a duração de 11 meses e quem o completa terá acesso à extensão universitária e estará credenciado à formação profissional com três possíveis orientações: educação, responsabilidade ecológica e gestão multicultural; liderança da comunidade e desenvolvimento dos processos participativos; arte, comunicação e produção multimídia. A proposta formativa desenvolve-se por meio de seminários especializados, estágios de trabalho e pesquisas aplicadas em campo, a partir dos valores do pensamento social cristão. Prevê-se ainda uma próxima integração com a seção latino-americana do Instituto Universitário Sophia. Situada nos arredores de O’Higgins, na província de Buenos Aires, a Mariápolis Lia oferece aos jovens uma experiência formativa que integra trabalho, estudo, atividades culturais e recreativas, esporte e interesses particulares. Essas atividades são compreendidas como diferentes aspectos de uma única formação integral. Com efeito, o conceito de estudante coincide com o de cidadão e, portanto, presume-se que todos sejam construtores da cidade. Uma equipe de especialistas e de professores nas diferentes disciplinas os acompanha na aprendizagem, do ponto de vista espiritual, antropológico, social e doutrinal. Os mais de 6 mil jovens que passaram um período na Mariápolis são, eles mesmos, a prova do seu valor formativo para a sua vida, feito frutificar em vários ambientes (empresários, economistas, educadores, profissionais, operários, pais, pessoas consagradas…). A “experiência” permanece um ponto luminoso por todo o percurso da vida, contribuindo na superação de circunstâncias humanas e profissionais difíceis.

Stefania Tanesini

Evangelho vivido/2 – Um pelo outro

Quantas vezes Deus faz com que nos aproximemos dele por meio de alguém? Nunca devemos esquecê-lo porque também nós poderemos ser instrumento dele algum dia para alguém. Uma nova esperança Estava estudando nos Estados Unidos e havia decidido voltar para casa por insistência dos meus pais, mas fiquei preso por causa da quarentena em um abrigo perto da fronteira com cerca de 500 pessoas. Tinha a sensação de estar numa prisão. Por sorte, meu celular me mantinha ligado ao mundo. Quando via alguém, lia em seu rosto os mesmos questionamentos que eu tinha sobre o que estava acontecendo. Durante aqueles dias, conheci “a distância” um padre salesiano. Mesmo isolado, como eu, emanava uma paz que nem eu nem os outros tínhamos. Era como se ele não se surpreendesse com nada. No começo, ele celebrava sozinho no seu quartinho, depois comecei a participar da missa. Logo, voltei aos sacramentos e à vida de fé de antes, mesmo que não como antigamente. Até a minha namorada percebeu que mudei. Às vezes, penso: se eu passei por essa transformação, o outros também não podem passar? E uma nova esperança nasceu em mim: que aquele mundo que antes parecia ter me deixado desesperançoso possa agora retomar o caminho sobre outros trilhos. K. – Eslováquia Carrinho de bebê Conheci uma jovem cigana que estava grávida. Precisava de tudo, roupas e todas as coisas para o nascimento do filho. Eu tinha lido no Evangelho: “Tudo o que pedirdes ao pai, Ele vo-lo concederá”. Naquele dia, durante a missa, pedi com fé a Jesus um carrinho de bebê. Mais tarde, na escola, me empenhei mais do que nunca a amar os colegas e professores. Voltando para casa à noite, soube que a mãe de uma vizinha, sabendo que ajudo os pobres, tinha deixado algo para mim. Era um carrinho de bebê! Fiquei comovida com essa resposta rápida da providênc C. – Espanha Bênção Sou enfermeiro há um mês, bem no período do corona vírus. No hospital onde eu trabalhava, compartilhei a solidão de diversos pacientes que passavam à outra vida sem o conforto da própria família. A experiência mais forte foi quando, sabendo pela minha mãe que, segundo as palavras do papa, também os médicos e enfermeiros estavam habilitados a dar uma bênção aos pacientes defuntos, pude fazer o sinal da cruz na testa e no peito de muitos deles antes de anunciar a hora da morte e enviar os corpos ao necrotério. Giuseppe – Itália

Por Stefania Tanesini