Fevereiro de 2021
O evangelista Lucas gosta de enfatizar a grandeza do amor de Deus mediante uma qualidade que certamente lhe parece descrever ao máximo essa grandeza: a misericórdia.
Na Sagrada Escritura, a misericórdia é, por assim dizer, a nuance materna do amor de Deus. É com esse amor materno que Ele cuida de suas criaturas, lhes dá alívio e conforto, consolo, acolhida, sem nunca se cansar. Pela boca do profeta Isaías, o Senhor promete ao seu povo: “Como a mãe que consola um filho, assim eu vos consolarei, e é em Jerusalém que sereis consolados”.[1]
Esse é um atributo reconhecido e proclamado também pelo islamismo: entre os 99 Nomes ou Atributos de Deus, aqueles que voltam com mais frequência aos lábios do fiel muçulmano são “o Misericordioso” e “o Clemente”.
Esta página do Evangelho nos apresenta Jesus diante de uma multidão, com pessoas vindas de cidades e de regiões até mesmo distantes, fazendo a todos uma proposta ousada, desconcertante: imitar Deus, o Pai, justamente no amor de misericórdia.
Um objetivo que, para nós, parece quase inimaginável, impossível de atingir!
“Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso.”
De acordo com a perspectiva do Evangelho, para imitar o Pai devemos antes de tudo nos colocar todos os dias no seguimento de Jesus e aprender com Ele a tomar a iniciativa no amor, tal como o próprio Deus faz conosco sem cessar.
É essa a experiência espiritual descrita pelo teólogo luterano Dietrich Bonhoeffer (1906- 1945): Todos os dias a comunidade cristã canta: “Recebi misericórdia”. Recebi esse dom até mesmo quando fechei meu coração a Deus; [...] quando me perdi e não encontrei o caminho de volta. Então, foi a palavra do Senhor que veio ao meu encontro. Então compreendi: Ele me ama. Jesus me encontrou: Ele esteve perto de mim, somente Ele. Foi Ele que me consolou, perdoou todos os meus erros e não me acusou do mal. Quando eu era seu inimigo e não respeitava os seus mandamentos, Ele me tratou como um amigo. [...] Tenho dificuldade em compreender por que é que o Senhor me ama tanto, por que é que sou tão precioso para Ele. Não consigo compreender como Ele conseguiu e por que quis conquistar o meu coração com o seu amor. Só posso dizer: “Recebi misericórdia”.[2]
“Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso.”
Essa frase do Evangelho nos convida a uma verdadeira revolução em nossas vidas: toda vez que somos confrontados com uma possível ofensa, em vez de seguir o caminho da rejeição, do julgamento inapelável e da vingança, podemos escolher o caminho do perdão, da misericórdia.
Não se trata tanto de cumprir uma obrigação difícil, mas sim de acolher a possibilidade oferecida por Jesus: passar da morte, do egoísmo, para a vida verdadeira, a vida de comunhão. Descobriremos com alegria que recebemos o mesmo DNA do Pai, que não condena ninguém definitivamente, mas dá a todos uma segunda oportunidade, abrindo horizontes de esperança.
Essa tomada de posição também nos permitirá preparar o terreno para relações fraternas, das quais pode nascer e se desenvolver uma comunidade humana finalmente orientada à convivência pacífica e construtiva.
“Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso.”
Foi isso que Chiara Lubich sugeriu, meditando a frase do Evangelho de Mateus[3] que proclama a bem-aventurança daqueles que praticam a misericórdia: O tema da misericórdia e do perdão permeia todo o Evangelho. [...] E a misericórdia é justamente a máxima expressão do amor, da caridade: é ela que leva a caridade à plenitude, ou seja, que a torna perfeita. [...] Em todos os nossos relacionamentos procuremos, portanto, viver esse amor pelos outros sob a forma de misericórdia! A misericórdia é um amor que sabe acolher todo e qualquer próximo, sobretudo o mais pobre e necessitado. É um amor que não mede, mas é abundante, universal, concreto. Um amor que procura suscitar a reciprocidade, objetivo principal da misericórdia. E sem a misericórdia existiria apenas a justiça, que serve para criar igualdade, mas não fraternidade. [...] Embora pareça difícil e ousado, perguntemo-nos, diante de cada próximo: como é que a mãe dele o trataria? Este é um pensamento que nos ajudará a entender e a viver em conformidade com o coração de Deus.[4]
Letizia Magri
[1] Cf. Is 66,13
[2] Dietrich Bonhoeffer. 23.01.1938. La fragilità del male. Coletânea de escritos inéditos. Piemme, 2015
[3] Cf. Mt 5,7: Bem-aventurados os misericordiosos, pois eles alcançarão misericórdia.
[4] LUBICH, Chiara. Um amor materno. Palavra de Vida, novembro de 2000
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Mi è particolarmente piaciuto il commento a questa Parola di Vita che, mettendo in risalto la misericordia, fa chiari riferimenti anche alle altre religioni. Con gioia ho sentito di poterla condividere anche con alcuni amici musulmani. Mi fa felice quando ci apriamo per prendere dentro tutti!!