Jesus tinha iniciado a sua vida pública fazia pouco tempo. Convidava à conversão, anunciava que o Reino de Deus está próximo, curava toda sorte de doenças e de enfermidades. As multidões começavam a segui-lo. Então ele subiu a uma montanha e, dirigindo-se a todos os que o rodeavam, expôs o seu programa de vida. É o que costumamos chamar de “Sermão da Montanha”.
A novidade do anúncio de Jesus fica evidente já desde as primeiras palavras do seu discurso, quando ele proclama feliz não quem é rico, poderoso, influente, mas quem é pobre, humilde, pequenino, puro de coração, quem chora e está oprimido. É a inversão do modo comum de pensar, sobretudo na nossa sociedade que muitas vezes valoriza o consumismo, o hedonismo, o prestígio… É a “boa nova” trazida por Jesus, que dá alegria e esperança aos últimos, que inspira confiança no amor de Deus, um Deus que vai ao encontro de quem está na provação e na dor. Esse anúncio de alegria e de salvação já está inteiramente resumido na primeira das oito bem-aventuranças, aquela que promete o Reino dos Céus aos pobres no espírito:

«Felizes os pobres no espírito…»

Mas o que significa ser “pobre no espírito”? Significa estar desapegado dos bens e das coisas que possuímos, das criaturas, de nós mesmos… Numa palavra, significa pospor no nosso coração tudo o que nos impede de nos abrirmos a Deus, para fazer a sua vontade, e de nos abrirmos ao próximo “fazendo-nos um” com ele para amá-lo como ele deve ser amado, prontos até mesmo a abandonar tudo: pai, mãe, “campos” e pátria, se é isso que Deus nos pede.  
Ser “pobre no espírito” significa depositar nossa confiança não nas riquezas, mas no amor de Deus e na sua providência. Muitas vezes somos “ricos” de preocupações pela saúde, de inquietação por causa de nossos parentes, de apreensões devido a um certo trabalho, de incertezas sobre a maneira de nos comportarmos, de receio pelo futuro… Tudo isso pode bloquear a nossa alma e fechá-la em si mesma, impedindo que se abra a Deus e aos irmãos. Pois bem, justamente nesses momentos de suspensão o “pobre no espírito” acredita no amor de Deus e lança nele toda e qualquer preocupação, experimentando o seu amor de Pai.
Somos “pobres no espírito” quando nos deixamos nortear pelo amor para com os outros. É então que partilhamos o que temos, colocando-o à disposição de quem quer que esteja em necessidade: um sorriso, o nosso tempo, os nossos bens, as nossas capacidades. Tendo doado tudo por amor, somos pobres, ou seja, estamos esvaziados, anulados, livres, e temos o coração puro.
Essa pobreza, que é fruto do amor, torna-se, por sua vez, fonte de amor: esvaziados de nós mesmos – e portanto livres -, estamos em condições de acolher plenamente, sem nenhuma reserva, a vontade de Deus, e de acolher cada irmão e cada irmã que passa ao nosso lado.
A todos aqueles que vivem essa pureza de coração e essa pobreza no espírito Jesus garante a posse do Reino dos Céus: eles são felizes porque deles é o Reino dos Céus.

«… porque deles é o Reino dos Céus.»

O Reino dos Céus não pode ser comprado com a riqueza nem pode ser conquistado com o poder. Ele é recebido de presente, gratuitamente. Por isso Jesus insiste que sejamos como crianças, ou como os pobres que precisam receber tudo dos outros, como as crianças. E o Espírito Santo, atraído por aquele vazio de amor, pode preencher a nossa alma porque não encontra nenhum obstáculo que impeça a plena comunhão com ele.
O “pobre no espírito”, não tendo reservado nada para si, tem tudo; ele é pobre de si mesmo e rico de Deus. Também aqui vale o dito evangélico: “Dai e vos será dado”; nós damos tudo o que temos e recebemos nada mais nada menos que o Reino dos Céus.
É a experiência de uma mãe de família, da Argentina, que nos conta:
“A minha sogra tinha muita afeição pelo seu filho, meu marido, chegando até a ser ciumenta. Essa atitude sempre criou dificuldades entre nós e endureceu meu coração diante dela. Um ano atrás, um exame médico revelou que ela estava com um tumor e precisava de cuidados e assistência que sua única filha não tinha condições de dar. As palavras do Evangelho, que eu estava procurando viver desde algum tempo, mudaram meu coração: eu estava aprendendo a amar. Superando todos os receios, acolhi minha sogra em casa. Comecei a vê-la com olhos novos e a querê-la bem: cuidando dela, era também de Jesus que eu cuidava, era a ele que eu dava assistência.
E ela, que não ficou indiferente ao amor, para minha grande surpresa retribuía cada gesto meu com igual amor. A graça de Deus tinha realizado o milagre da reciprocidade!
Passaram-se meses de sacrifícios – que não foram um peso para mim – e, quando minha sogra nos deixou serenamente e foi para o Céu, ficamos todos com a paz no coração.
Naquele período percebi que eu estava esperando um filho, que nós desejávamos havia nove anos! Esse filho é para nós o sinal concreto do amor de Deus que nos plenifica”.

Chiara Lubich

 

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