Se existe uma realidade misteriosa na nossa vida, essa é o sofrimento. E bem que gostaríamos de evitá-lo; no entanto, mais cedo ou mais tarde ele acaba chegando: uma simples dor de cabeça que parece estragar as mais corriqueiras ações do dia-a-dia, ou o desgosto por um filho que enveredou por um mau caminho; o fracasso no trabalho, ou o acidente que leva embora um amigo ou alguém da família; a humilhação pelo insucesso numa prova, ou a nossa angústia por causa das guerras, do terrorismo, dos desastres ambientais….
Diante da dor nós nos sentimos impotentes. Até alguém que está próximo a nós, e nos quer bem, freqüentemente é incapaz de nos ajudar a superá-la; mesmo assim, às vezes nos basta que alguém se disponha a dividir a dor conosco, embora em silêncio.
Foi isso que Jesus fez: ele veio para estar perto de cada homem, de cada mulher, até compartilhar tudo o que é nosso. Ainda mais: ele tomou sobre si todas as nossas dores e se fez dor conosco, até o ponto de gritar:

“Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

Eram as três da tarde quando Jesus lançou este grito ao céu. Fazia três longas horas que Ele estava suspenso na cruz, pregado pelas mãos e pés.  
Tinha vivido a sua breve vida num contínuo ato de doação a todos: tinha curado os doentes e ressuscitado os mortos, tinha multiplicado os pães e perdoado os pecados, tinha pronunciado palavras de sabedoria e de vida.
Mais ainda: na cruz, dá o perdão aos carrascos, abre o Paraíso ao ladrão e, enfim, nos doa o seu corpo e o seu sangue, depois de tê-los dado a nós na Eucaristia. E por fim grita:

“Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

Mas Jesus não se deixa vencer pela dor; como que por uma alquimia divina, Ele transforma a dor em amor, em vida. Com efeito, justamente enquanto parece sentir a infinita distância do Pai, Ele, com um esforço desmedido e inimaginável, acredita no seu amor e volta a se abandonar totalmente Nele: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (cf. Lc 23,46).
Jesus restabelece a unidade entre o Céu e a terra, abre-nos as portas do Reino dos céus e nos torna plenamente filhos de Deus e irmãos entre nós.
É o mistério de morte e de vida, que celebramos nestes dias de Páscoa, dias de ressurreição.
É o mesmo mistério que a primeira discípula de Jesus, Maria, experimentou em plenitude. Também ela, aos pés da cruz, foi chamada a “perder” o que tinha de mais precioso: o seu Filho Deus. Mas naquele momento, justamente porque aceita o plano de Deus, ela se torna Mãe de muitos filhos, nossa Mãe.

“Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

Por meio da sua dor infinita, que é o preço da nossa redenção, Jesus se faz solidário conosco em tudo, toma sobre si o nosso cansaço, as nossas ilusões, os desnorteamentos, os fracassos, e nos ensina a viver.
Se é verdade que ele assumiu todas as dores, as divisões, os traumas da humanidade, então é verdade também que, lá onde vejo um sofrimento, em mim ou nos meus irmãos e irmãs, posso reconhecer Jesus. Cada dor física, moral, espiritual me faz lembrar Dele, é uma presença sua, um semblante seu.
Posso dizer: “Neste sofrimento eu te amo, Jesus abandonado. És tu que, assumindo como tua a minha dor, vens me visitar. Então eu te quero, te abraço!”.
Depois,se estivermos atentos em amar, em corresponder à sua graça, em querer aquilo que Deus quer de nós no momento seguinte, em viver a nossa vida por Ele, experimentaremos que, na maioria das vezes, a dor desaparece. E isto porque o amor atrai os dons do Espírito: alegria, luz, paz. E resplandece em nós o Ressuscitado.

 

Chiara Lubich

 

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