Movimento dos Focolares

Venezuela: anotações de viagem

Set 27, 2016

A narração de quem visitou o país sul-americano, com um olhar especial sobre os bem jovens. A vontade deles de resgate e a esperança no futuro, começando a construí-lo em primeira pessoa.

Venezuela_04«Volto aqui após 5 anos: o impacto é desolador, não reconheço a Venezuela. A descrição que o jovem sentado ao meu lado no avião me tinha feito exprime a dor de um povo aflito, mas não resignado. “Tenho ainda um pouco de esperança!”, me disse, descrevendo os lugares mais bonitos da sua terra e me convidado a visitá-los. Em Caracas as pessoas transmitem uma sensação de vazio. Só as crianças dão um toque de vitalidade numa realidade que parece se mostrar absurda. A viagem para Puerto Ayacucho durou mais de 17 horas. Ao longo do trajeto o olhar se detém na direção de um jovem que, revistando a lata do lixo, procura selecionar alguns restos de comida. Mas é sobretudo a notícia de dois adolescentes, de 14 e 15 anos, mortos porque foram encontrados roubando mangas numa árvore, que me evidencia em que nível de medo e de falta de partilha se chegou. É este um outro tipo de homicídio devido à fome. A cidade é na fronteira com a Colômbia. A chaga que a infesta é representada pelos homicídios de jovens que, aos olhos de quem deveria protegê-los, aparecem violentos, ladrões, para os quais serve a punição extrema. Assim aconteceu também a Felipe Andrés, um jovem de dezessete anos que, para proteger o irmão, não revela àqueles que o levaram preso da casa da avó onde pudesse se encontrar. Por esta sua atitude é brutalmente morto com o número de tiros equivalente aos seus anos. Venezuela_nuvolettaEstamos num dos bairros da periferia de Valência. Fico impressionado com uma fila para comprar botijões de gás. Angel, 12 anos, cândido como o seu nome, me confidencia com desarmante simplicidade: “Eu não cresço porque não bebo leite”. Também o leite em pó está entre os bens mais preciosos do país. Ficam impressos em mim os olhos simples e vivíssimos das crianças conhecidas. Uma noite com os jovens. Sente-se uma grande vontade de resgate. As experiências deles reforçam aquele querer ser portadores de esperança, começando pelos seus amigos, na escola, no trabalho… Na Nuvenzinha. Um micro-ônibus nos leva lá em cima, onde se encontra o Centro Mariápolis “La Nuvoletta” (“A Nuvenzinha”). Chega-se lá percorrendo lugares marcados pela pobreza. Também aqui diversas filas à espera de poder comprar algum produto. Gabriel me agradece pelo macarrão que lhe ofereci. “Sabe que eu como macarrão só no domingo?” – “E nos outros dias?” – pergunto. “Nos outros dias, só sopa”. Pergunto se está contente por estarmos juntos. “Sim – me responde –, porque aqui todos estão contentes”. Venezuela_07No momento da partida outra notícia desoladora: fico sabendo que Fabián, um adolescente tão límpido e vivaz, poucos meses antes perdeu o pai de modo trágico, morto por assassinos de aluguel. Começo a lhe contar a minha experiência: justamente a doença e a partida para o céu de meu pai, fez com que eu me reaproximasse de Deus. Nós nos olhamos e parece que nos entendemos pelo menos um pouco. Chegamos a Maracaibo, a cidade mais quente da Venezuela. Damos uma volta e percorremos os mais de 8 quilômetros da ponte que a une a San Francisco. Em Tamale nos espera uma jornada com os adolescentes do Movimento Juvenil pela unidade. Ouvir uma jovem de treze anos contar: “Encorajei a minha mãe a perdoar aqueles que mataram o meu pai”, não pode deixar indiferentes. Em seguida, o encontro marcado é numa paróquia. Eles nos acolhem com canções, e depois se inicia o diálogo: “O que fazer quando um jovem diz a você que não volta para casa porque não tem nada para comer?”. Procuro responder falando da dor e do silêncio de Deus que Jesus sentiu na Cruz. Despedimo-nos com o pensamento que um dos adolescentes comunica a todos: “A força do amor é mais forte do que a dor”». (A. S.)

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Subscrever o boletim informativo

Pensamento do dia

Artigos relacionados

Sementes de paz e de esperança para o Cuidado da Criação

Sementes de paz e de esperança para o Cuidado da Criação

No dia 2 de julho de 2025 foi publicada a mensagem do Santo Padre Leão XIV para o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, que será celebrado dia 1º de setembro. Propomos uma reflexão de Maria De Gregorio, especialista em desenvolvimento sustentável, da Fundação Ecosistemas, especializada em estratégias e ações para reduzir os riscos e os impactos ambientais.