Movimento dos Focolares

Medicina: a pessoa no centro

Out 3, 2013

O que acontece no coração de um médico diante dos próprios pacientes? Narrativa da responsável de um presídio hospitalar na Itália. Nos dias 18 e 19 de outubro, em Pádua, se reunirão muitos profissionais do setor da saúde para uma troca de reflexões e propostas a este respeito.

Estou em pé, próximo ao Setor de Emergência, quando vejo duas pessoas elegantes, perfeitamente maquiadas e bem vestidas. Do fundo do corredor, elas chegam com uma criança que vestia um agasalho esportivo cuja medida era bem maior do que o seu corpo e que caminha de modo inseguro, com o olhar assustado tendo nas mãos um avião que mantinha apertado contra o peito. Eu me pergunto quem será a mãe daquela criança que não se assemelha com nenhuma das duas que, entre outras coisas, juntas, informam a idade e o estado de saúde da criança… enquanto isso, Vito, rígido na poltrona do ambulatório, recusa terminantemente a troca do avião por um álbum de figurinhas, proposta pela enfermeira que tentava fazer com que ele estendesse o braço para o exame de sangue.”

É a narrativa de Marina D’Antonio, uma médica italiana, “apaixonada pelo Evangelho”, ela mesma assim se descreve, que colecionou uma infinidade de episódios com pacientes de todas as idades e proveniências. Qual o segredo disto? Deixar de lado as regras e imposições que, muitas vezes, se escondem atrás do jaleco branco e mirar a pessoa que se tem diante, assumindo a sua humanidade. Nesta narrativa o protagonista é uma criança. E, enquanto a publicamos, uma centena de médicos se prepara para reunirem-se em Pádua (Itália), nos dais 18 e 19 de outubro, para dois dias de congresso sobre o significado da medicina hoje, entre globalização, sustentabilidade e personificação dos tratamentos.

Nestes casos, normalmente – continua a médica – pede-se a colaboração da mãe… e, eis que as duas jovens, ao mesmo tempo, prontamente se colocam uma à esquerda e outra à direita de Vito. Uma delas o entretém dizendo-lhe que o avião precisa posicionar-se em uma pista de decolagem (a minha escrivaninha) para que o co-piloto possa embarcar (um boneco vermelho e preto) que, magicamente, surge da bolsa. Vito concorda e entende também que a decolagem só pode ser feita com a devida autorização da torre de controle. E eu fico esperando pela segunda mágica, que deveria induzir a criança a permitir que a enfermeira introduza a agulha-borboleta. E eis que a segunda jovem tira da bolsa uma flor de tecido amarelo e uma borboleta de tecido vermelho e diz: “Vito, olha só, Fiorina, esta borboleta colhe o néctar desta florzinha… aquela outra borboleta verde prefere o néctar do bracinho do Vito!” Ele se volta para a segunda borboleta e a enfermeira, velocíssima e com um gesto muito profissional, introduz a agulha-borboleta.

Vito não chora mais ao seguir o vôo da borboleta vermelha que gira ao redor do seu braço, e pousa, delicadamente, um segundo depois que a enfermeira colocou um esparadrapo colorido e faz a agulha-borboleta pousar dentro do recipiente apropriado para lixo hospitalar. Eu permaneço maravilhada com o comportamento daquelas duas mães excepcionais. A enfermeira, admirada ao ouvir uma afirmação de uma daquelas jovens, pergunta: ‘Mas… como? Quantos filhos vocês têm?!

Elas sorriem e respondem: ‘Bom, neste momento temos quinze.’ E explicam que são educadoras e que trabalham em uma Casa Família do serviço público de saúde no nosso território. A mãe de Vito era portadora de AIDS e falecera. O pai estava em uma comunidade que se ocupa de toxicodependentes em recuperação. O Juizado de Menores decidira que Vito deveria permanecer na Casa Família até a idade prevista por lei para que se possa decidir se ele pode ou não ser adotado. Vito tinha quatro anos e, coisa insólita, não sabia ainda falar.

No fim do expediente não fui almoçar, não voltei para casa e cancelei todos os compromissos previstos para a tarde. Programei o GPS e tomei a direção da Casa Família e, ao chegar, toquei a campainha impacientemente… e ofereço-me para fazer alguma coisa, qualquer coisa! E assim começou a minha aventura como voluntária ao lado de crianças abandonadas, maltratadas, assustadas… mas, que sempre aceitam o meu desafio: não obstante tudo, qualquer coisa que já aconteceu ou que acontecerá, nós continuaremos a brincar!

Comecei a brincar com eles. Durante uma tarde, no grande terreno ao lado da Casa Família – que por motivos de segurança, foi construída em um local isolado – um jovem pousou com uma grande asa delta colorida. Vito olhou para mim e, indicando a asa delta, pronunciou: “Papai!”

Foi a primeira palavra dita por ele, densa como um discurso convincente, comovente como os anos de espera olhando para o céu. Foi a primeira palavra que Vito me deu de presente! Ele queria ir embora com o seu pai que viria das nuvens! E, finalmente, há poucos dias, isso realmente aconteceu!”

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