Uma cidade que partisse do nada chegaria ao nada, movida por impulsos que levam à nulidade. Uma sociedade que partisse da cobiça por dinheiro levaria ao combate para conquistá-lo. Uma que partisse só do estômago terminaria num esgoto. Mas, a vida parte da vida. A política é guiada pela justiça. Mas se fosse apenas justiça permaneceria estéril para aqueles cidadãos que fossem vencidos nas competições da existência. Se é o contrário aperfeiçoa-se com a caridade, e dessa autoridade faz-se serviço; um serviço realizado com respeito à pessoa humana e com um sentimento de débito para com a miséria. Concebida assim a política sente-se responsável pelo bem de todos os cidadãos, inclusive dos últimos: não cessa de impedir o mal, de manter a ordem externa, mas esforça-se em suscitar o bem, com uma ordem diferente, tornando-se uma atividade supremamente benéfica. A política, fora da lei de Deus, transforma-se em uma maldição para os administradores; na lei de Deus torna-se uma ajuda vigorosa para alcançar fins individuais, familiares, profissionais. E se executa a lei de Deus, edifica a cidade de Deus. Nela a caridade exclui o egoísmo de manter-se à parte e dá a cada um o dever de assistir a comunidade, e vê o interesse público não como uma categoria externa, mas como interesse comum, no qual estão incluídos os destinos das respectivas famílias e pessoas. Chama-se, de fato, “bem comum”. O homem pacífico não ignora a luta, o homem da caridade não ignora o ódio. Logo que sai da “cela do próprio eu” encontra o adversário. É um irmão, mas reduzido a inimigo. E com frequência recebe tanto mal pelo tanto que faz de bem. E a cada passo é instigado à vingança, e talvez por dez, dezesseis, vinte horas, nada mais faz do que viver dentro de estímulos de ambição e seduções de corrupção. Sim, porque o seu é só um combate contra a luxúria, a guerra e o ódio: mas combater é viver como sinal de contradição. Igino Giordani, Le due città, Città Nuova, 1961.
Superar os nossos confins para ir ao encontro do próximo
Superar os nossos confins para ir ao encontro do próximo




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