Movimento dos Focolares

Esta maldição da guerra

Jun 26, 2025

“Eu via o absurdo, a estupidez e, principalmente, o pecado da guerra...”. Igino Giordani, ao escrever as suas memórias, reflete sobre o período terrível da Primeira Guerra Mundial, quando ele mesmo foi convocado. O “massacre inútil”, como a definiu Bento XV. As suas palavras nos fazem pensar em como a história poderia nos ensinar a trabalhar pela paz, nos nossos dias, combatendo contra os novos, absurdos, inúteis massacres do nosso século.

Eu não entendia como era possível gerar um jovem à vida, fazê-lo consumir-se em estudos e sacrifícios, com o objetivo de que amadurecesse para uma operação na qual deveria matar pessoas estranhas a ele, desconhecidas, inocentes; e ele, por sua vez, deveria deixar-se matar por pessoas a quem não havia feito nenhum mal. Via o absurdo, a estupidez e, principalmente, o pecado da guerra: pecado que os pretextos que a cercavam tornavam ainda mais grave, e pelo modo fútil como era decidida.

O Evangelho, já muitas vezes meditado, ensinava-me, como dever incontestável, a fazer o bem e não a matar; perdoar e não me vingar. E o uso da razão quase me dava a medida de uma operação que conferia os frutos da vitória não a quem tinha razão, mas a quem tinha canhões; não à justiça, mas à violência […].

No “radiante mês de maio” de 1915 fui chamado às armas […]

Quantas trombetas, quantos discursos, quantas bandeiras! Coisas que infiltravam no meu espírito a repugnância por aquelas batalhas, com governos encarregados pelo bem público que realizavam sua missão matando os filhos do povo, centenas de milhares deles; destruindo e deixando destruir os bens da nação: o bem público. E quanto tudo isso me pareceu estúpido! Eu sofria por milhões de criaturas forçadas a crer na santidade daqueles homicídios, santidade confirmada inclusive por eclesiásticos que abençoavam canhões, destinados a ofender a Deus na obra-prima da criação, a matar a imagem de Deus, a consumar o fratricídio na pessoa de irmãos, além do mais batizados.

“Eu via o absurdo, a estupidez

e, principalmente, o pecado da guerra…”.

Eu era um recruta e fui enviado a Módena, onde havia uma espécie de universidade para a formação de guerreiros e duques. Tendo deixado Virgílio e Dante, o estudo de certos manuais que ensinavam como enganar o inimigo para conseguir matá-lo, provocou um tal efeito em mim que – com insuperável imprudência – escrevi num deles: “Aqui se aprende a ciência da imbecilidade”. Eu tinha um conceito muito diverso de amor à pátria. Eu o concebia como amor, e amor quer dizer serviço, busca do bem, aumento do bem-estar para a produção de uma convivência mais feliz: para o crescimento, e não o estrangulamento, da vida.

Mas eu era jovem e não entendia os raciocínios dos anciãos, que não faziam questão de entender: ficavam maravilhados com os cortejos e gritavam slogans para narcotizar-se.

[…]

Depois de algumas semanas – diplomado em Módena – voltei para casa, e em seguida partiria para a linha de frente. Abracei minha mãe e meu pai, os irmãos e as irmãs (o abraço era muito pouco praticado na minha casa), e tomei o trem. Passando de trem, vi o mar pela primeira vez, era bem mais largo do que o Aniene, e foi como se tivesse realizado um dos deveres da minha existência. Em três dias cheguei na trincheira do Isonzo, no 101º Regimento de Infantaria.

A trincheira! La dentro eu passei da escola para a vida, entre os braços da morte com as salvas de canhão. […]

Se disparei cinco ou seis tiros, para o alto, o fiz por necessidade: jamais dirigi o cano do fuzil na direção da trincheira adversária, por temor de matar um filho de Deus. […]

Se todos aqueles dias passados no fundo da trincheira, olhando para caniços e ramos floridos, para nuvens cansadas e céus azuis, nós os tivéssemos passado trabalhando, teria sido produzida uma riqueza capaz de saciar todas as reinvindicações pelas quais a guerra era travada. Isso é certo: mas este era um raciocínio, e a guerra é um “anti-raciocínio”.

Igino Giordani
Memórias de um cristão ingênuo, Ed. Cidade Nova 2022.

Aos cuidados de Elena Merli

Foto: © ZU via Fotos Públicas

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