Na terça-feira, 04 de março, iniciou-se o 17º ano letivo do IsstitutoUniversitárioSophiaem Loppiano (Figline e Incisa Valdarno – Florença). A cerimônia ocorreu na Sala Magna do Instituto, com a presença de toda a comunidade acadêmica e de uma representação da rica rede de parceiros e colaboradores que o Instituto Universitário Sophia soube construir com Instituições, outras universidades e realidades do terceiro setor nesses 17 anos de vida.
A programação contou com: o Magnífico Reitor Declan O’Byrne; o Grão-Chanceler do Instituto, S. E. Mons. Gherardo Gambelli, arcebispo de Florença; a Vice Grã-Chanceler, Dra. Margaret Karram, presidente do Movimento dos Focolares; o bispo de Fiesole, S. E. Mons. Stefano Manetti; o prefeito de Figline e Incisa Valdarno, Valerio Pianigiani; Paolo Cancelli, diretor do Escritório de Desenvolvimento da Pontificia Università Antonianum; Marco Salvatori, presidente do Centro Internacional Estudantil Giorgio La Pira.
No centro da cerimônia, a aula inaugural intitulada “Diálogo, religiões, geopolítica” dada por Fabio Petito, professor de relações internacionais e diretor da Freedom of Religion or Belief & Foreign Policy Initiative na Universidade de Sussex, além de coordenador científico do Programa de religiões e relações internacionais do Ministério de Relações Exteriores e ISPI (Instituto de Estudos de Política Internacional). Petito destacou como hoje “areligião parece ser parte e, às vezes, o centro do cenário atual de instabilidade e crise internacional”. Porém, apesar de se tratar de um fenômeno menos visível globalmente, “não se pode negar que no último quarto de século houve um crescimento significativo do esforço de representantes das comunidades religiosas em responder à violência e tensões políticas por meio de iniciativas de diálogo e colaboração inter-religiosa”. Petito destacou, assim, a importância que lugares como o Instituto Universitário Sophia podem ter em aprofundar e difundir com criatividade a cultura do encontro e “fazer florescer sementes de esperança e frutos de unidade e fraternidade humana”.
Prof. Fabio Petito
Em pleno estilo Sophia, comunidade acadêmica internacional e laboratório de vida, formação, estudo e pesquisa, depois da aula inaugural houve um momento de diálogo, moderado pelo jornalista do Vaticano Andrea Gagliarducci (Eternal Word Television Network e ACI Stampa), que teve como protagonistas o Grão-Chanceler Mons. Gherardo Gambelli, em sua primeira visita ao Instituto, e a vice Grã-Chanceler dra. Margaret Karram e seis estudantes da universidade.
O diálogo, partindo das histórias pessoais dos jovens provenientes da Terra Santa, Filipinas, Argentina, Kosovo, Serra Leoa e Peru, abordou temas de importância global e atualidade sensível: o valor da diplomacia de base para a resolução dos conflitos e a busca pela paz; o esforço por uma economia mais justa e igual, com a experiência de Economy of Francesco; o papel dos jovens do Mediterrâneo na construção de uma cultura do encontro; o valor da
reconciliação e do diálogo inter-religioso, em particular entre cristãos e muçulmanos com a experiência de Sophia de Wings of Unity; a esperança dos jovens africanos envolvidos no projeto Together for a New Africa, para a mudança e o bem comum do continente deles; a inquietude e fragilidade dos jovens em busca de uma vocação e realização no mundo globalizado.
O início do ano letivo 2024-25 evidenciou, mais uma vez, a capacidade dessa ainda pequena realidade acadêmica de formar jovens preparados para enfrentar a complexidade do mundo atual, em uma perspectiva transdisciplinar e de trabalhar em sinergia com especialistas de vários campos e Instituições para promover concretamente na vida social o diálogo entre culturas, impulsionando o crescimento interior, intelectual e social das pessoas em uma dinâmica de reciprocidade.
Declarações
O Grão-Chanceler do Instituto, S. E. Mons. Gherardo Gambelli, arcebispo de Florença: “Entre os objetivos do Instituto, está aquele de ‘promover o diálogo entre as culturas concretamente na vida social, impulsionando o crescimento interior, intelectual e social das pessoas em uma dinâmica de reciprocidade’. Emergem diversas palavras-chave neste projeto: promoção, vida social, diálogo, crescimento interior, intelectual e social, reciprocidade. Todos esses termos são endereçados ao crescimento pessoal, tornando, assim, o indivíduo capaz não só de saber habitar dignamente o ‘nós’ da comunidade na qual está inserido, mas também de se sentir sempre mais habitado por aquele ‘nós’ ao qual pertence. Um ‘nós’ que não quer se contrapor a um hipotético ‘vocês’, mas que se torna cotidianamente capaz de abraçar tudo o que se apresenta com a face do outro, do diferente, do excluído”.
A vice Grã-Chanceler, dra. Margaret Karram, presidente do Movimento dos Focolares: “É importante que em uma instituição como a nossa se destaque o diálogo e o papel das religiões na situação mundial atual, na qual – como estamos vendo nesses últimos dias – pessoas e povos correm o risco de se afogar na desorientação e desconforto. (…) O Instituto Universitário Sophia, enquanto ‘casa’ de uma cultura fundamentada no Evangelho, também está comprometido com e na Igreja para oferecer respostas e orientações à luz do carisma da unidade. Cabe a nós, agora, a tarefa de ir para frente com coragem e nos empenharmos para que a o trabalho deste Instituto Universitário em vista da promoção da cultura da unidade, que participa na construção da paz e da fraternidade entre pessoas e povos, seja cada vez mais reconhecido”.
Declan O’Byrne, Magnífico Reitor do Instituto Universitário Sophia: “Juntos, como uma comunidade acadêmica unida por um ideal comum, continuamos a construir o Instituto Sophia como um farol de sabedoria e unidade no panorama da educação superior. Que o nosso empenho coletivo possa continuar a iluminar as mentes, inspirar os corações e transformar a sociedade, com um passo de cada vez, em direção àquela civilização de amor que todos desejamos”.
Valerio Pianigiani, prefeito de Figline e Incisa Valdarno: “Diante das divisões e violência que não podem nos deixar indiferentes, a sabedoria, o conhecimento, a tolerância e a compreensão do mundo que nos circunda podem ser o antídoto para a brutalidade e divisões. Uma ponte que ajuda a compreender o outro, sob a ótica de trabalhar todos juntos e de nos empenharmos pelo bem comum. Obrigado a quem trabalha neste Instituto com paixão e comprometimento todos os dias para fazer crescer mentes sempre mais conscientes também aqui, em Figline e Incisa Valdarno, uma comunidade que cresce firmemente no valor da paz, da solidariedade e do diálogo”.
Stefano Manetti, bispo de Fiesole: “O esforço em dialogar e se comunicar com todos encurta as distâncias, elimina a marginalização, se torna um sinal de esperança evangélico de que precisamos muito. Portanto, meus votos são que os docentes e estudantes continuem a resgatar os últimos por meio do dom das relações, da partilha de temas culturais, e que continuem sendo ‘anjos da esperança’ para todos aqueles que encontrarem em seu caminho”.
Paolo Cancelli, diretor do Escritório de desenvolvimento da Pontificia Università Antonianum: “Estamos convencidos de que devemos trabalhar juntos na cultura do diálogo como caminho, na colaboração comum como conduta, no conhecimento recíproco como método e critério. (…) Devemos colocar no centro a humildade, a vocação de servir um processo no qual temos uma certeza: ninguém se salva sozinho. E justamente nessa lógica, que é aquela da sinfonia da diversidade, chegou o momento de colocar em campo os nossos talentos, as nossas emoções, a nossa vontade, para construir aquela que é a oportunidade de um futuro diferente. Um futuro no qual a fraternidade e a harmonia possam de algum modo nos acompanhar nessa sinfonia da diversidade que tornam autêntica a missão universitária. Acredito que a nível acadêmico e a nível científico, se realize a inter e transdisciplinaridade. Temos diante de nós um poliedro de complexidade e não podemos resolver situações sozinhos de uma única matéria. É preciso a ideia de estarmos juntos”.
Marco Salvadori, Presidente do Centro Internacional Estudantil Giorgio La Pira: “É com grande alegria que trago as saudações do Centro Internacional Estudantil Giorgio La Pira. O início de um novo ano letivo é sempre um momento de grande entusiasmo e reflexão. É a oportunidade de olhar para frente, de aceitar os desafios e de contribuir com a construção de um mundo mais justo e sustentável por meio do estudo, empenho e dedicação. O que celebramos hoje não é só o início de um novo ano letivo, mas a possibilidade de aprender, crescer juntos e construir laços duradouros entre culturas e gerações. Então, desejo a todos, em especial aos jovens estudantes, um ano rico de descobertas, de crescimento pessoal e profissional”.
Marta, Lina, Efi e Moria são quatro mulheres, quatro focolarinas, que na vida percorreram caminhos diferentes e que agora acharam um ponto de encontro entre sonhos, realidade e a disponibilidade de transferimento dos seus focolares para Chimaltenango, com o objetivo de iniciar uma experiência de vida comunitária em uma cidade onde pobreza, interculturalidade e divisões entre etnias são o pão de cada dia.
Chimaltenango é uma cidade da Guatemala, a 50 km da capital, a 1.800 metros acima do nível do mar. Com uma população de quase 120.000 habitantes de 23 diferentes povos indígenas que se reuniram lá para conseguir sobreviver economicamente.
“Vivi na Argentina durante muitos anos”, diz Efi, originária do Panamá. “Em seguida transcorri alguns anos no México e, pouco antes da pandemia, cheguei à Guatemala, onde permaneci apenas três meses. Logo precisei ir ao Panamá para ficar com minha mãe, que adoeceu e faleceu. Foi um ano que me serviu também para refletir sobre muitas coisas, para fazer um balanço do que eu tinha vivido até então, e para renovar a minha decisão, tomada anos atrás, de doação a Deus”. Ela retornou à Guatemala para este projeto em Chimaltenango.
“Cresci em um ambiente rural, com gente muito simples e meu sonho sempre foi fazer algo pelos mais humildes”, nos diz Efi. “Aqui a pobreza é muito grande. E há também as comunidades indígenas, há pessoas que conheceram a espiritualidade do Movimento dos Focolares e que, devido à pandemia e a realidade social em que vivem, foram deixadas à margem (da sociedade)”.
Lina é guatemalteca, de origem Maia, Kaqchikel. Ela nos explica que uma das divisões mais evidentes é entre indígenas e mestiços (também chamados de “ladinos” na Guatemala, eles englobam todos aqueles que não são indígenas). Não há relações fraternas, não há diálogo. “Para mim, sempre foi um objetivo superar aquela divisão. Desde o momento em que tive meu primeiro contato com o Movimento dos Focolares, pensei que essa seria a solução para a minha cultura, para o meu povo, para a minha gente”. Ela recorda também do momento que, em dezembro de 2007, na conclusão do período de formação à vida comunitária no focolare, quando despediu-se de Chiara Lubich, dizendo-lhe: “Sou indígena e comprometo-me em levar essa luz ao meu povo Kaqchikel. Senti que era um compromisso expresso diante dela, mas assumido com Jesus”. Em seu retorno à Guatemala, dedicou-se com empenho ao acompanhamento das novas gerações, sempre com o objetivo de criar vínculos de unidade tanto nas comunidades indígenas quanto na cidade.
Moria, Lidia, Marta, Lina, EfiLina visita uma famíliaCom um grupo no focolare
Marta também é guatemalteca. Mestiça. Em seus primeiros anos no focolare, pôde dedicar-se também à difusão do carisma da unidade nas comunidades indígenas. Posteriormente, ocupou-se da gestão do Centro Mariápolis, local para os encontros, na Cidade da Guatemala. Um trabalho intenso que durou 23 anos que assistiu ao desenvolvimento do processo de reconciliação nacional e da reivindicação dos povos indígenas, pois as diferentes comunidades indígenas escolheram o Centro Mariápolis como lugar de encontro. A seguir esteve no México por um período. Naquela época, falava-se de identidade. E espontaneamente surgiu-lhe a pergunta: “Qual é a minha identidade? Quais são as minhas raízes?” Ela encontrou a resposta na Virgem de Guadalupe, que, na sua aparição no México, em 1531, foi representada no poncho de Juan Diego com características somáticas típicas dos povos originários americanos. “Compreendi que eu era mestiça como ela, que possui ambas as raízes, portanto podia dialogar com as duas partes”.
Moria, que é de Chimaltenango, por motivos de saúde vive com sua família, mas é membro do focolare, assim como Lídia, uma focolarina casada que vive na Cidade da Guatemala.
Histórias que se entrelaçam até se estabelecerem nessa cidade que reúne várias proveniências, muitas culturas em uma única cultura. “Nosso desejo é estar com as pessoas, aproximarmo-nos delas. Nas coisas simples, do dia a dia”, diz Efi, “um simples cumprimento, um sorriso, parar um instante, fazer companhia àquela senhora que não sabe falar espanhol, porque fala sua própria língua e não nos entendemos”. E nos conta: “Um dia, precisei comprar pão. Fui ao mercado e as mulheres que vendiam estavam sentadas no chão em uma esteira de vime. Para dialogar com uma delas, me coloco no mesmo nível, me inclino. Como se trata de uma atividade comercial, não tento negociar para baixar o preço”.
“Desde que chegamos, nos propusemos a retomar o contato com as pessoas que, em momentos diferentes, conheceram a espiritualidade da unidade — intervém Lina — indo visitá-las em suas casas, levando sempre algo, uma fruta, por exemplo, como é costume entre esses povos”. Deste modo, cria-se um círculo de reciprocidade que as aproxima ao focolare. Na casa ressoam vozes de mães com os filhos, também de jovens e, às vezes, de alguns pais que tomam coragem e as acompanham. E assim, sem precisar procurar, surge uma comunidade em torno desse novo focolare, no coração da cultura indígena da Guatemala.
Estimado Papa Francisco, talvez o senhor não se lembre, mas nós nos encontramos no dia 26 de setembro de 2014, quando o senhor recebeu em audiência privada uma delegação do Movimento dos Focolares. Eu, Luciana Scalacci, de Abadia San Salvatore, também fazia parte dela, representando as culturas não religiosas que também se encontram no Movimento dos Focolares. Sou uma daquelas pessoas que, como me disse Jesus Moran, “ajudaram Chiara Lubich a abrir novos caminhos para o carisma da unidade”. Uma pessoa sem um referencial religioso que recebeu muito do Movimento.
Naquele dia extraordinário, tive o privilégio de compartilhar com o senhor algumas palavras que jamais esquecerei, e que gostaria de citar.
Luciana: “Santidade, quando o senhor tomou posse como bispo de Roma, eu lhe escrevi uma carta, mesmo sabendo que o senhor não teria a oportunidade de lê-la, com a infinidade de cartas que recebe, mas era importante para mim manifestar-lhe o meu afeto e os meus votos, porque eu, Santidade, não me identifico com nenhuma fé religiosa, porém há mais de 20 anos faço parte do Movimento dos Focolares, que me devolveu a esperança de que ainda é possível construir um mundo unido.
Papa: “Reze por mim. Na verdade, a senhora, não possuindo um referencial religioso, não reza. Pense em mim, pense em mim intensamente, pense em mim sempre, eu preciso”.
Luciana: “Mas veja, Santidade, eu rezo pelo senhor do meu jeito”.
Papa: “Isso mesmo, uma oração leiga e que pense em mim intensamente, eu preciso”.
Luciana: “Vossa Santidade, com saúde, com coragem, com força! A Igreja Católica e o mundo inteiro precisam de Vós. A Igreja Católica precisa de Vós”.
Papa: “Pensem fortemente em mim e rezem secularmente por mim”.
Agora, querido Papa Francisco, o senhor está em um leito de hospital, e eu estou na mesma condição. Ambos estamos enfrentando a fragilidade da nossa humanidade. Eu gostaria de lhe assegurar que não deixo de pensar e rezar do meu jeito leigo, pelo senhor. O senhor reze de modo cristão por mim. Com afeto carinho,
A Presidente do Movimento dos Focolares, Margaret Karram, enviou uma mensagem ao Santo Padre assegurando-lhe sua afetuosa proximidade e fervorosas orações.
“Peço a Nossa Senhora que lhe faça sentir Seu amor materno e aquela ternura que o senhor sempre nos recomenda ter pelo bem de cada próximo e de cada povo”, escreveu a presidente.
“Infinitamente gratos pela sua vida inteiramente doada a Deus e ao bem da humanidade” – acrescentou – “envio-lhe o abraço de todo o Movimento dos Focolares no mundo, que constantemente reza e oferece tudo pelo senhor.”
Margaret, por que você escolheu a proximidade como tema do ano para o Movimento dos Focolares?
Eu me perguntei em que tipo de mundo vivemos. Tenho a impressão de que neste momento da história existe muita solidão e indiferença. Há uma escalada da violência e das guerras, e isso causa muito sofrimento no mundo. Além disso, pensei na tecnologia que nos conectou de maneira nunca vista antes, mas que, ao mesmo tempo, nos torna cada vez mais individualistas. Em um mundo como este, creio que a proximidade possa ser um antídoto, uma ajuda para superar esses obstáculos e curar esses “males” que nos mantêm distantes uns dos outros.
Por onde podemos começar?
Há meses eu me faço essa pergunta. Parece-me que precisamos reaprender a nos aproximarmos das pessoas, reaprender a olhar e a tratar todos como irmãos e irmãs. Percebi que, antes de tudo, precisava fazer uma análise sobre a minha atitude. As pessoas que encontro todos os dias são, para mim, irmãos e irmãs? Ou sou indiferente a elas, ou até mesmo os considero inimigas? Eu me fiz muitas perguntas. Descobri que às vezes quero evitar uma pessoa, porque talvez ela vá me incomodar, ou me atrapalhar, ou me dizer coisas difíceis. Por tudo isso, quis dar à minha reflexão sobre a proximidade, que apresentei em meados de novembro aos responsáveis do Movimento dos Focolares, o seguinte título: “Quem é você para mim?”
Você poderia apresentar as principais ideias que desenvolveu a respeito desse título?
Com prazer. Menciono quatro pensamentos. A primeira proximidade que a nossa alma experimenta é a do contato com Deus. É Ele mesmo que se transmite aos outros também por nosso intermédio. O desejo de amar o outro é um movimento que parte da presença de Deus em mim para Deus no outro.
Uma segunda reflexão: a proximidade é dinâmica. Exige uma abertura total, ou seja, acolher as pessoas sem reservas; entrar na sua maneira de ver as coisas. Não somos feitos em série! Cada um de nós é único, com caráter, mentalidade, cultura, vida e história diferentes. Reconhecer e respeitar isso exige que saiamos dos nossos esquemas mentais e pessoais.
Você falou de um terceiro aspecto…
Sim. O terceiro aspecto que quero sublinhar é que a proximidade não coincide necessariamente com o fato de estar perto, de ser semelhante ao outro, como, por exemplo, pertencer ao mesmo horizonte cultural. A parábola do Bom Samaritano (Lucas 10,25-37) expressa muito bem isso. Fiquei impressionada com a atitude do Samaritano: o homem que tinha caído nas mãos dos assaltantes era uma pessoa desconhecida para ele, era até mesmo de outro povo. Vinha de uma cultura e tradição bem distantes da sua. Mas o samaritano se fez próximo. Esse é o ponto-chave para mim. Cada um tem a própria dignidade, independentemente do povo, da cultura da qual provém ou do seu caráter. O samaritano não se aproximou somente para ver se essa pessoa estava ferida e depois ir embora ou, se necessário, pedir ajuda. Ele se aproximou e cuidou da pessoa. O quarto aspecto…
… seria…
…deixarmo-nos ferir. Para que a proximidade dê frutos, ela requer que cada um de nós não tenha medo e que se deixe ferir pelo outro.
Isso significa: deixarmo-nos questionar, expormo-nos a perguntas para as quais não temos respostas; estarmos dispostos a nos mostrarmos vulneráveis; talvez apresentando-nos como pessoas fracas e incapazes. O efeito de tal atitude pode ser surpreendente. Imagine que um menino de nove anos me escreveu que, para ele, proximidade significa “elevar o coração do outro”. Não é um efeito maravilhoso de proximidade? Elevar o coração do outro.
O que mudaria no Movimento dos Focolares se vivêssemos bem a proximidade?
Se a vivermos realmente bem, muitas coisas mudarão. É o que desejo, é o que espero, e rezo para que seja assim. Mas também quero destacar que muitos no Movimento dos Focolares já vivenciam a proximidade. Existem muitas iniciativas, projetos em prol da paz e para ajudar os pobres. Abrimos até mesmo alguns focolares para prestar assistência e acolher imigrantes ou para cuidar da natureza.
E o que deveria mudar?
A qualidade dos relacionamentos entre as pessoas. Às vezes é mais fácil tratar bem as pessoas que não fazem parte do Movimento e é mais difícil entre nós que fazemos parte da mesma família. Corremos o risco de viver entre nós relacionamentos de “boas maneiras”: não nos magoamos, mas, eu me pergunto, será que essa relação é autêntica?
Espero que, não só nos projetos, a proximidade se torne um estilo de vida quotidiano; que nos perguntemos várias vezes durante o dia: “Estou vivendo essa proximidade? Como a vivo?”. Uma expressão importante da proximidade é o perdão. Ser misericordioso para os outros – e para nós mesmos.
Qual é a mensagem dessa reflexão para a sociedade?
A proximidade não é apenas uma atitude religiosa ou espiritual, mas também civil e social. Pode ser vivenciada em qualquer contexto. Na educação, por exemplo, ou na medicina, até mesmo na política, ambiente no qual talvez seja mais difícil. Se vivermos bem, poderemos influir de modo positivo nos relacionamentos, onde quer que estejamos.
E para a Igreja?
A Igreja existe porque, com a vinda de Jesus, Deus se tornou próximo. A Igreja, as Igrejas são chamadas a testemunhar uma proximidade vivida. A Igreja Católica vivenciou recentemente o Sínodo. Pude participar das duas sessões no Vaticano. Éramos mais de 300 pessoas, cada uma de uma cultura diferente. O que fizemos? Um exercício de sinodalidade, um exercício de escuta, de conhecimento profundo, de acolhimento do pensamento dos outros, dos seus desafios e sofrimentos. São características da proximidade.
O título do Sínodo era “Caminhar Juntos”. Esse caminho envolvia muitas pessoas no mundo inteiro. O logotipo do Sínodo expressava o desejo de estender a tenda da Igreja para que ninguém se sinta excluído. Parece-me que esse é o verdadeiro significado da proximidade: que ninguém seja excluído; que todos se sintam acolhidos, não importa se frequentam ou não a Igreja, se não se reconhecem nela ou até quem se afastou por vários motivos.
Gostaria de abordar por um momento os limites da proximidade. Como vivê-la bem?
Essa é uma pergunta importante. Existem limites para a proximidade? Como primeira resposta, eu diria que não deveria haver limites.
Porém?
Não podemos ter certeza de que a proximidade e a solidariedade representam para os outros a mesma coisa que representam para nós. Em um relacionamento, nunca pode faltar o respeito à liberdade e à consciência do outro. Essas duas coisas são essenciais em qualquer relacionamento. Por isso é importante que, quando nos aproximamos de uma pessoa, isso seja sempre feito com delicadeza, e não como algo imposto. É o outro quem decide o quanto e que tipo de proximidade deseja.
Precisamos aprender, não é mesmo?
Sem dúvida. Cometemos vários erros. Pensando que amávamos o outro, nós o ferimos. No ardor de comunicar a nossa espiritualidade, construímos relacionamentos nos quais o outro nem sempre se sentiu livre. Às vezes me parece que, com a boa intenção de amar uma pessoa, nós a esmagamos. Não tivemos sensibilidade e respeito suficientes pela consciência, pela liberdade, pelo tempo do outro. E isso levou a certas formas de paternalismo e até mesmo de abuso.
Estamos enfrentando uma situação muito dolorosa, na qual as vítimas têm uma importância única, realmente única. Sozinhos não conseguimos entender completamente o que aconteceu. São as vítimas que nos ajudam a entender os erros que cometemos e a tomar as medidas necessárias para garantir que essas coisas nunca mais aconteçam.
Uma última palavra?
Espero que esse tema possa nos fazer retornar à essência do que o próprio Jesus nos deu no Evangelho. Ele nos deu muitos exemplos do que significa viver a proximidade.
Um pensamento de Chiara Lubich ressoou fortemente em mim, quando comecei a pensar nesse assunto. Ela diz: “Há quem faça as coisas ‘por amor’. Há quem faça as coisas procurando ‘ser o Amor’. […] O amor nos abriga em Deus, e Deus é o Amor. Mas o Amor, que é Deus, é luz, e com a luz vemos se o modo como nos aproximamos e servimos o irmão está em conformidade com o Coração de Deus, está como o irmão gostaria, como ele sonharia se estivesse a seu lado não nós, mas Jesus”.
Obrigado de todo coração, Margaret, pela sua paixão pela proximidade vivida com decisão e respeito.