“Vocês aspiram, vocês trabalham por um mundo unido” (um mundo de paz e fraternidade).
“E o que fazem? Atividades que podem até parecer pequenas e desproporcionais diante do objetivo estabelecido, embora as intenções sejam significativas. Talvez, […] alguns irão trabalhar diretamente em várias organizações orientadas ao mundo unido.
É verdade que tudo isso já será muito útil, mas creio que não será nem uma coisa nem outra que dará a contribuição decisiva.
Será oferecer ao mundo […] uma alma. Esta alma é o amor. […]
Hoje é essencial “ser o amor”, ou seja, sentir com o outro, viver o outro, os outros e almejar a unidade […] em todo o planeta.
Construir relacionamentos de unidade” (de solidariedade ) “que estão enraizadas no amor.
Devem viver este amor em primeiro lugar entre vocês.
E assim conseguirão realizá-lo com muitos, […] entre os povos e com aqueles que dirigem os destinos dos povos, nas instituições e organizações pequenas e grandes no mundo, em todo o lugar. Só assim as intenções de quem as instituiu alcançará o seu objetivo e trabalharemos realmente por um mundo unido”, (um mundo mais pacífico).
Chiara Lubich
Este pensamento foi lido por Margaret Karram, presidente do Movimento dos Focolares, durante a Conexão de 28 de setembro de 2024. Pode ser visto clicando aqui.
Já se passaram 75 anos do dia em que Chiara Lubich escreveu “Tenho um só Esposo na terra”, proposto novamente aqui. É um escrito destinado a ser, desde o início, um verdadeiro Manifesto programático para Chiara e para aqueles que a seguiriam aderindo à Espiritualidade da Unidade.
O manuscrito autógrafo, conservado no Arquivo Chiara Lubich (AGMF) e escrito em uma única folha, frente e verso, registra a data da redação: 20.9.1949. Publicado pela primeira vez em 1957 de forma incompleta e com algumas variações na edição italiana da revista “Cidade Nova”, foi depois reapresentado em outras publicações de escritos de Chiara, até ser finalmente retomado, de forma integral e correspondente ao manuscrito original, no livro O Grito (Roma: Città Nuova, 2000. São Paulo: Cidade Nova, 2000), que Chiara Lubich quis escrever pessoalmente “como um canto de amor” dedicado precisamente a Jesus Abandonado.
O trecho nasceu como uma espécie de diário, escrito de ímpeto. Pela particular intensidade lírica que o permeia, poderia ser definido como um “hino sagrado”. Essa definição parece apropriada se levarmos em conta que o termo “hino” se origina do grego hymnos. A palavra, embora com etimologia discutível, tem uma estreita relação com o antigo Hymēn, o deus grego do matrimônio, em cuja honra os antigos cantavam. Por outro lado, nessa redação, a dimensão esponsal está presente mais do que nunca, inclusive porque – e precisamente porque – nos encontramos em um contexto altamente místico. É realmente um “canto” de amor a Jesus Abandonado.
O contexto da redação nos remete ao período do verão italiano de 1949, quando Chiara, com as suas primeiras companheiras e os dois primeiros focolarinos, estava nas montanhas – no vale de Primiero, no Trentino-Alto Ádige – para um período de férias. Por alguns dias, também Igino Giordani (Foco), que havia tido a oportunidade de conhecer Chiara no Parlamento pouco antes, em setembro de 1948, uniu-se ao grupo. Ele tinha ficado fascinado pelo carisma dela.
Foi um verão definido pela própria Chiara como “luminoso”, pois – percorrendo as suas etapas – ela não hesitou em afirmar que, precisamente naquele período, compreendeu melhor “muitas verdades da fé e, em particular, quem era Jesus Abandonado, que recapitulou tudo em si, para os homens e para a Criação”. “A experiência foi tão forte – observa – que nos fez pensar que a vida seria sempre assim: luz e Céu” (O Grito, p. 57). Mas chegou o momento – solicitada pelo próprio Foco – de “descer das montanhas” para ir ao encontro da humanidade sofredora e abraçar Jesus Abandonado em cada expressão de dor, em cada “abandono”. Como Ele. Somente por amor.
Nessa ocasião, ela escreveu: “Tenho um só Esposo na terra: Jesus Abandonado”.
Maria Caterina Atzori
20-9-49
Tenho um só Esposo na terra: Jesus Abandonado. Não tenho outro Deus além Dele. Nele está todo o Paraíso com a Trindade e toda a terra com a Humanidade.
Por isso, o seu é meu e nada mais.
Sua é a Dor universal e, portanto, minha.
Irei pelo mundo à sua procura em cada instante da minha vida.
O que me faz sofrer é meu.
Minha, a dor que me perpassa no presente. Minha, a dor de quem está ao meu lado (ela é o meu Jesus). Meu, tudo aquilo que não é paz, gáudio, belo, amável, sereno… Numa palavra: aquilo que não é Paraíso. Pois eu também tenho o meu Paraíso, mas Ele está no coração do meu Esposo. Outros Paraísos não conheço. Assim será pelos anos que me restam: sedenta de dores, de angústias, de desesperos, de melancolias, de desapegos, de exílio, de abandonos, de dilacerações, de… tudo aquilo que é Ele, e Ele é o Pecado, o Inferno.
Assim, enxugarei a água da tribulação em muitos corações próximos e – pela comunhão com meu Esposo onipotente – distantes.
Passarei como Fogo que devora tudo o que há de ruir e deixa em pé só a Verdade.
Mas é preciso ser como Ele, ser Ele no momento presente da vida.
Chiara Lubich O Grito (Cidade Nova, São Paulo, 2000, p. 58)
Chiara Lubich teve essa intuição em 1977, quando recebeu em Londres, o Prêmio Templeton para o Progresso da Religião. Desde então, a difusão mundial do espírito dos Focolares contribuiu para abrir um diálogo com todas as principais religiões do mundo. Um caminho que nem mesmo Chiara havia imaginado no início e que Deus lhe indicou, revelando ao longo do tempo, por meio de eventos e circunstâncias; um caminho a seguir rumo à unidade. Neste breve trecho, Chiara, respondendo a uma pergunta sobre o relacionamento com diversas religiões, revela o segredo para construir uma verdadeira fraternidade universal: buscar, na diversidade, aquilo que nos une. A pergunta feita a Chiara é lida por Giuseppe Maria Zanghì, um dos primeiros focolarinos. (Trecho de uma resposta de Chiara Lubich no encontro dos amigos muçulmanos, Castel Gandolfo, 3 de novembro de 2002)
Giuseppe Maria Zanghì: Gostaríamos de perguntar: Chiara, como você se sente no relacionamento com pessoas de outras religiões e como isso ressoa dentro de você?
Chiara Lubich: No relacionamento com fiéis de outras religiões, eu sempre me senti muito bem! Porque, embora sejam religiões diferentes, temos muitas coisas em comum, e isso nos une. Por sua vez, a diversidade nos atrai e nos deixa curiosos. Portanto eu fico contente por dois motivos: venho a conhecer outras coisas, eu me inculturo na outra cultura, mas também descubro irmãos iguais, porque acreditamos em muitas coisas iguais. A mais importante – eu já disse isso na outra vez – é a famosa “regra de ouro”. É a frase: “Não faça aos outros o que não gostaria que fosse feito a você”. Essa frase está presente em todas as religiões mais importantes, nas suas Escrituras, nos seus livros sagrados. Está no Evangelho também para os cristãos. Esta frase “não faça aos outros o que não gostaria que fosse feito a você” quer dizer: trate bem os seus irmãos, tenha muita estima por eles, ame-os. Entao, quando eles descobrem essa frase na sua Escritura, eu descubro a mesma frase na minha, eu amo, eles amam, nós nos amamos e esta é a base para começar a fraternidade universal. O primeiro passo: a “regra de ouro”. A segunda pergunta: “O que você sente dentro quando encontra um irmão de outra religião ou uma irmã?” Sinto logo um grande desejo de fraternizar, de criar a unidade, de estabelecer um relacionamento fraterno. […]
É uma tensão constante porque a nossa natureza ama a si própria.
Com frequência, a crônica registra desastres, terremotos, ciclones que provocam vítimas, feridos, desabrigados. Mas, uma coisa é ser um deles e outra coisa é sermos nós.
E, ainda que a providência nos proporcione algo para correr ao socorro deles, nós não somos nunca os mais prejudicados.
Amanhã pode ser o inverso: eu sobre um leito (se eu tiver um leito!) de morte e os outros fora, ao sol, gozando, como podem, da vida.
Tudo o que Cristo comandou supera a natureza.
Mas, inclusive o presente que ele nos deu, aquele mencionado à samaritana, é de natureza não humana. De forma que, a ligação com a dor do irmão, com a alegria e as preocupações do outro, é possível porque temos em nós a caridade, que é de natureza divina.
Com este amor, ou seja, o amor cristão, o irmão pode ser verdadeiramente confortado e, amanhã, eu por ele.
Desse modo é possível viver, porque, de outra forma, a vida humana seria por demais dura, difícil, aliás, às vezes pareceria impossível.
(Do Diário 1964-1980, Chiara Lubich, Città Nuova, 2023)
A edição do Diário de Chiara Lubich foi organizada por Fabio Ciardi. Convidamos todos a assistirem a entrevista, realizada por nós, no momento da sua apresentação.
Nos primeiros dias de agosto, em Trento, Itália, foi realizada a Escola Fogo, um curso do Movimento dos Focolares para os e as Gen 3, os adolescentes do Movimento.
Os participantes foram 350 – dos 14 aos 17 anos, juntamente com seus assistentes, de 18 anos ou mais – provenientes de 19 países, com 12 línguas diferentes. Pouco mais de uma semana para aprofundar temas relativos à adolescência, viver em profundidade o relacionamento com Deus, descobrir como é possível viver o Ideal da unidade e da fraternidade universal e construí-lo dia a dia, apesar das ameaças de guerra em várias partes do mundo. Houve ainda o Festival dos Povos, quando cada nação pode apresentar cantos, danças, roupas típicas, fotos e alimentos especiais. Uma maneira para conhecer a cultura do outro e construir um pedaço de mundo unido e fraterno.
Aqui estão alguns testemunhos
Sofia, da Itália: “Decidi participar da Escola Fogo para ter um relacionamento mais íntimo com Jesus. Nessa escola aprendi o modo de amar sempre as pessoas que estão perto de mim. Consigo enfrentar melhor momentos de dificuldade e de sofrimento, sentindo-me perto de Jesus”.
Veronika, da Croácia: “Vivi um espírito de unidade que brota do desejo de paz e de comunidade, que se baseia sobre a oração e sobre o diálogo com Deus. Depois de ter escutado os testemunhos sobre a violação da paz, sobre a luta para manter a paz em si mesmo, na família, no próprio país, foi como se despertasse em mim o desejo de fazer de tudo para mantê-la em todos os lugares”.
Naomi, da Índia: “Frequentei a Escola Fogo para melhorar minha relação com Deus. No final, o que levo para casa é o modo como posso encontrar conforto, nos momentos de dificuldade ou de dor, pensando a Jesus Abandonado na cruz. Mas descobri ainda o poder da reconciliação, por meio da confissão. Procurarei fazer tudo o que posso para propagar o Evangelho e tornar a minha cidade um lugar de amor”.
Tomás, de Portugal: “Durante o Festival dos Povos, fiquei orgulhoso de mostrar o nosso país e, ao mesmo tempo, conhecer as culturas dos outros países. Depois dessa escola, sinto falta de tudo o que vivemos lá, mas quero viver todos os dias tudo o que aprendi”.
Emanuel, da Croácia: “Na Escola Fogo, eu gostei muito do Festival dos Povos. Pudemos conhecer culturas diferentes e pratos tradicionais. Lá eu conheci muitos amigos e provei muitas especialidades. Eu faria novamente esta experiência, até 100 vezes!”.
Glória, do Brasil: “Percebi a mudança no meu relacionamento com Deus. No início não conseguia me conectar com Ele e perceber sua presença nas pessoas, mas depois de escutar tantas experiências e fazer tantas reflexões, posso facilmente sentir Sua presença em cada situação. Além disso, aprendi a ajudar as pessoas que não me agradam, ajudar as pessoas que tem problemas e a identificar Deus em cada um”.
Sarahi, do México: “Entendi que, mesmo vivendo em países diferentes e até em continentes muito distantes, o Ideal da unidade pode sempre ser vivido. Foi uma linda experiência conhecer a cultura de outros países, a comida, suas roupas, algumas palavras e tradições. O que eu levo da escola, antes de tudo, é que deixei de ter medo da confissão e isso fez crescer a minha fé em Deus. A Missa, todos os dias, ajudou-me muito, espero continuar a ir todos os domingos, de espontânea vontade”.
Sebastian, da Croácia: “Eu gostei muito quando apresentamos os nossos países, no Festival dos Povos, cada um mostrou alguma tradição do próprio país. Era muito divertido quando jogávamos futebol, à tarde, e assim nos conhecíamos mais. O meu momento preferido foi a festa final, quando cantamos e nos divertimos. A minha vida mudou depois da Escola, agora procuro viver o Evangelho, amando as pessoas que estão perto de mim”.
Silvia, da Itália: “Depois da Escola a minha vida teve uma reviravolta e comecei a ver o mundo com olhos diferentes. Foi a experiência mais significativa da minha vida e me deixou a vontade de conseguir me parecer com o que Chiara Lubich sempre desejou para os Gen”.
Ana, da Itália: “Aconselho com força aos Gen que ainda não frequentaram a Escola Fogo a fazê-lo! Vocês vão se divertir muito, posso garantir”.
Jakov, da Croácia: “Na Escola Fogo eu entendi a importância da unidade. Quando cheguei todos eram acolhedores, parecia que éramos uma só família. Raramente eu tive essa sensação antes, talvez nunca. Eu entendi, também, como amar e querer bem a todos, independentemente de quem são e de suas raízes. Eu gostaria de viver outros encontros desse tipo, foi uma experiência inesquecível!”.
Júlia, do Brasil: “Levo para casa o amor sem medidas de Jesus por mim e por todos, assim como a esperança e a sensação de querer que o mundo unido se torne realidade. Ver que Jesus ama cada um de nós e poder sentir o Seu amor, na Escola Fogo, foi uma das experiências mais lindas que fiz e que, certamente, levarei comigo. Reencontrei a esperança e a fé. Agora o desafio será levar o amor e a unidade que experimentei na Escola ao ‘mundo real’, em casa, na escola, com os meus amigos. Mas são as lembranças e o amor por aquilo que aprendi nessa experiência que me levam a não desistir e a lutar por um mundo unido”.
Maria Teresa, da Itália: “Eu participei da Escola Fogo porque tinha o desejo de conhecer mais as origens do Movimento dos Focolares. Levo comigo a esperança de um mundo melhor para a nossa geração. A minha vida melhorou porque entendi que devo olhar para ela de uma outra perspectiva, fazer de cada obstáculo um trampolim! Sendo muito insegura, tenho sempre medo de tocar o violino em público. Quando me propuseram de tocar na Escola fiquei um tanto preocupada. Mas, um dia, foi falado sobre como, cada um de nós pode doar aos outros um talento seu ou uma qualidade, que Chiara Lubich chamava ‘a pérola’. Então decidi doar a minha pérola aos outros e, quando estava tocando com uma outra gem, um grupo e meninos e meninas se aproximou para nos acompanhar com o canto, dando o seu apoio. Eu vivi a palavra do Evangelho de São Lucas, ‘Dai e vos será dado’ (Lc 6,38)”.
Elena, da Itália: No final desta Escola, eu levo para casa o que entendi durante um dia dedicado a Jesus, na sua dor, o abandono na cruz. Tocou-se profundamente, também porque, graças aos testemunhos dos Gen, consegui entender como superar uma dor com o amor”.
Tomás, de Portugal: “Levo para casa a descoberta de Jesus Abandonado, o poder da oração, além do fato de ter feito a confissão. Levarei o amor de Deus em qualquer lugar que eu vá; eu reforcei a minha fé, aprendi muito nesta Escola”.
Nestes dias, vi, pela televisão, atletas, muito jovens, na sua maioria dos países do Leste, que se exibiam em maravilhosos exercícios de ginástica artística. Eram magníficas nos seus repetidos saltos mortais, nas piruetas e em todos os seus movimentos. Que perfeição! Quanta harmonia e quanta beleza! Possuíam um domínio tão perfeito do próprio corpo que os exercícios mais difíceis pareciam naturais. São as melhores do mundo.
Enquanto as admirava, senti várias vezes dentro de mim, um convite urgente (talvez do Espírito Santo). Era como se Alguém me dissesse: Você também e todos vocês devem se tornar campeões do mundo. Mas campeões em quê? No amor a Deus. Sabem quanto essas jovens tiveram que treinar? Vocês sabem que dia após dia, hora após hora, elas repetem os mesmos exercícios, sem nunca desistir? Você também e todos vocês devem fazer o mesmo. Quando? No momento presente. Sempre, sem parar jamais. No meu coração nasceu um desejo enorme: o de trabalhar, momento a momento, para atingir a perfeição.
Caríssimos, São Francisco de Sales disse que não existe índole tão boa que de tanto repetir atos viciosos não possa adquirir o vício. Então, podemos pensar que não existe índole tão perversa que à força de atos virtuosos não possa conquistar a virtude. Portanto, coragem! Se treinarmos, nos tornaremos campeões do mundo no amor a Deus. (…)
(…)
Que Palavra Deus disse ao nosso Movimento? Nós sabemos: Unidade. Assim sendo, devemos nos tornar campeões da unidade com Deus, com a sua vontade no momento presente, e campeões da unidade com o próximo, com qualquer próximo que encontrarmos durante o dia.
Treinemos sem perder minutos preciosos! O que nos aguarda, não é uma medalha de ouro, mas o Paraíso